Convidamos todas e todos para ouvirem ao programa Viva la música! Moçambique + Brasil, com Mariana Bretas e Edson Guambe, e conheça alguns dos ritmos moçambicanos.
Enquanto a música toca, aproveitem para ler alguns dos materiais que estão sendo construídos pelos investigadores vinculados ao convênio UFV-UEM.
Um convênio, muitos encontros
Ainda estão frescos na memória o cheiro e o sabor da manga madura, colhida de uma das exuberantes mangueiras do amplo jardim da casa dos artistas Luís Santos e Sara Carneiro. Num dia de chuva intensa e ruas alagadas entre Maputo e Matola foram as visitas às casas-ateliês de Miguel César e Luís Santos, pai e filho, ao Instituto Superior de Arte e Cultura (Isarc), onde Luís e Sara são também professores, e à exposição individual de Santos, no Centro Cultural Franco-Moçambicano (CCFM), que me fizeram experienciar um dos dias de mais inesquecíveis em Moçambique.
A receptividade de Alzira e Miguel César, mãe e pai do artista Luís Santos, com a conversa ao pé do fogão, e logo à mesa, compartilhando saberes e histórias foram marcantes. Mas tudo começa no Brasil, com um feliz encontro com Edson Guambe, meu então aluno moçambicano e orientando de TCC, no curso de Comunicação Social/Jornalismo, da UFV. Dessa parceria, surgiram um CD de rap e uma amizade que me levaram ao encontro dessa família de artistas completos, em Moçambique. Ali mãe, pai e filho, dividem histórias e compartilham do saber e do fazer ARTE. Alzira é a responsável pelos sabores, que saem de sua machamba, seu mágico quintal, com a horta e o jardim impecáveis. Miguel César é um dos mais importantes escritores e poetas moçambicanos na atualidade. Pintor, desenhista, gravurista é também arquiteto, suas obras estão no Museu Nacional de Arte e também nas capas de livros próprios e de escritores outros, como de Mia Couto. Luís Santos herdou os talentos dos pais e soube inventar os seus próprios.
Tive a sorte de ver montada sua primeira exposição individual no CCFM, “Aquilo que o corpo já esqueceu”, com curadoria de Sara Carneiro, sua parceira de vida e trabalho. As obras de Santos, vistas em conjunto na ampla sala do Centro Cultural, já davam aos que ali passeavam uma dimensão das inquietações investigativas do artista. A mistura de materiais e suportes, figuras geométricas e humanas em profusão, texturas e suportes diversos, causavam um desconcerto à primeira vista. Aos poucos as formas iam impregnando o olhar e sendo armazenadas em outros lugares… mente, coração e alma. Em uma primeira conversa a vontade de conhecer de perto o processo criativo e de experimentação do artista, que para minha surpresa também cria suas próprias ferramentas. E foi no Isarc onde pude ver, nas salas de aula, alguns dos trabalhos realmente prometedores de alunos talentosos e dedicados às artes e seus ofícios, guiados pelas mãos de Luís e Sara.
Voltamos ao Brasil com o convênio entre a UFV e a UEM assinado. A missão acadêmica foi cumprida em seu objetivo principal, mas para além dele, fica a certeza de que o intenso roteiro, com a agenda apertada de compromissos, também possibilitou felizes e duradouros encontros.
A cultura e a consciência da nação: O contributo da música para criação da identidade nacional
Quando se fala de Moçambique trata-se de um país com diversidade etnolinguística e cultural, mesmo assim constitui uma nação diferente de muitos países ocidentais, onde a nação significa
mesma língua e mesma cultura. Um fator que pode ser verificado no final da guerra fria na Europa, onde a cortina ferro já não existia, os movimento nacionalistas surgiram a reivindicar as fronteiras, o exemplo concreto desse movimento é a Jugoslávia com a morte de Tito em 1980 houve enclosão nacionalista constituido por seis Repúblicas (Eslovénia, Croácia, BosniaHezergovina, Sérvia, Montenegro, Macedonia) e outras duas províncias autônomas (Voivodina, Kosovo). Estes não conseguiram conviver dentro da mesma fronteira porque não tinham mesma cultura e nem mesma língua, por essa razão não era uma nação de ponto de vista europeu.
A definição de nação tem variado de acordo com região, para países africanos, nação significa uma história comum entre diversos grupos culturais e linguísticos, és a razão que Rita-Ferreira num dos seus documentos, chama moçambicanos de povos de Moçambique, por considerar esta diversidade linguística e cultural, mas a música moçambicana tem lutado para limar com estas diferenças e mostrando que somos todos os moçambicanos, não é o rio Lurio, nem Zambezi, nem Save, nem Pungue, Icomate, que faz Moçambique, estes devem-se juntarem para compor Moçambique. um grupo por si só não faz Moçambique. Moçambique não são apenas os Macondes na região de Cabo Delgado, não são os Macuas de Nampula, não são os Nhungue de Tete, não são Machuabo da Zambezia, não são os Macenas e Ndaus do Centro, não são os Bitongas de Inhambane, não são os Tsongas (Maxanganas) de Gaza e nem Rongas de Maputo, todos eles juntos são os moçambicanos.
Durante séculos verificou-se muitas influências religiosas, desde Islão, Cristianismo e outros grupos religiosos, contando que já havia a religião africana, estes todos separados não fazem Moçambique, moçambicano é muçulmano, moçambicano é Testemunha de Jeová, é Católico, é Mazione, é Protestante, é tudo quanto existe em Moçambique. Somos filho de muitas águas correndo em muitos canos.
A estratégia colonial era dividir para poder reinar, durante a luta de libertação música foi fundamental para consciêncializar os moçambicanos a questão da unidade, na medidas em que as primeiras resistências não tinham tido sucesso por falta de união entre irmãos, a música moçambicana está em todos os momentos da vida social, económica e política dos moçambicanos, lutando para o desenvolvimento dos moçambicanos.
Este documento inspira-se na música da Banda Gorwane (Goruane), que atualmente tem como vocalista principal Roberto Chitsondzo, a música é um apelativo para a união dos moçambicanos, que nenhum fator social e político deve dividir os moçambicanos. Moçambicano é preto, é branco, é indiano, é todo individuo que nasceu em Moçambique ou que tenha ascendência moçambicana, durante a luta colonial o inimigo não era definido pela cor, mas sim pela atitude imperialista.
Ensaio de Matheus Serva Pereira (ICS-ULisboa) e Priscila Dorella (UFV) aborda a relação dos músicos moçambicanos com as formas de poder existentes no período colonial e pós-colonial do país. O texto completo pode ser lido no portal Buala.
Ensaio de Matheus Serva Pereira (ICS-ULisboa) e Priscila Dorella (UFV) aborda as realidades do meio urbano de Maputo durante o período colonial e pós-colonial, apontando para as realidades excludentes que foram usadas muitas vezes pelas populações africanas em proveito próprio. O texto completo pode ser lido no portal Buala.
Uma pauta importante das lutas anticoloniais contemporâneas está no esforço de desracializar a História da África, rechaçar sua exotização e compreender o continente como parte da história global. Nessa direção, os estudos desenvolvidos na América Latina sobre a África cresceram exponencialmente nas últimas décadas, ampliando os interesses para além das experiências de escravização. Para mais informações sobre o dossiê organizado por Priscila Ribeiro Dorella (UFV) e Matheus Serva Pereira (ICS-ULisboa), na Revista Eletrônica da ANPHLAC, clique aqui.