Você está visualizando atualmente Ainda Estou Aqui e cenas que marcam a memória da ditadura

Ainda Estou Aqui e cenas que marcam a memória da ditadura

A sensibilidade em retratar uma ferida da história brasileira que necessita, mais do que nunca, ser relembrada

No dia 7 de novembro, Ainda Estou Aqui estreou nos cinemas e eu não tive outra alternativa além de correr para a primeira sessão.

O filme de produção brasileira narra a memória de Rubens Paiva, deputado assassinado em 1971 nas dependências do DOI (Departamento de Operações de Informações) da Tijuca, no Rio de Janeiro, vítima do golpe da Ditadura Militar do Brasil.

Estrelado por ninguém mais que Fernanda Torres e Selton Mello, o conjunto de cenas impactantes me fizeram ter dificuldade em levantar da cadeira e fazer o caminho de casa sem cair no choro algumas vezes. Por isso, separei (com muita dificuldade) algumas partes que mais me tocaram e fizeram refletir o peso do que estava sendo representado.

Sorriso de despedida

Reprodução: Ainda Estou Aqui

No momento em que Rubens é levado para o que seria um interrogatório, apesar de toda a tensão, ele escolhe manter a calma, se vestir apropriadamente e dar um beijo de despedida em sua esposa Eunice. Antes de entrar no carro, ele olha para Eunice mais uma vez e sorri, como quem diz que “vai ficar tudo bem”.

Mesmo sem saber o que realmente se passava, as expressões de Eunice mostram que ela entende aquilo como uma despedida e retribui toda a calma e zelo do esposo.

Cortinas se fechando

Reprodução: Ainda Estou Aqui

Depois da partida de Rubens, os agentes que ficam na vigia da casa da família fecham as cortinas e trancam as portas da residência, impedindo a visão da rua.

Acredito que nesse momento minha tensão começou de verdade. A casa escura e abafada reflete uma sensação claustrofóbica, junto com a incerteza do que pode acontecer agora que as mulheres e crianças estão vulneráveis na companhia de desconhecidos.

Chegada de Eunice em casa

Reprodução: Ainda Estou Aqui

Após doze dias presa, sendo interrogada, torturada e sem saber exatamente onde estava, Eunice toma um longo banho e a cena que mostra ela esfregando a bucha com força em todo o corpo me impactou de uma maneira bem profunda.

Ao vivenciar certa forma de abuso, até depois de nos limpar externamente, ainda carregamos um resquício de sujeira e vulnerabilidade. Mesmo lavando o cabelo, limpando o corpo e escovando os dentes, o gosto amargo e as cicatrizes não vão embora pelo ralo.

Entrega do atestado de óbito de Rubens

Reprodução: Ainda Estou Aqui

Em 1996, depois de 25 anos na luta por justiça, Eunice e seus filhos finalmente recebem o atestado de óbito de Rubens. Na cena, ela descreve a sensação de felicidade e alívio ao receber o documento, e depois comemora com os caçulas.

Esse momento traz consigo a reflexão de como algo tão simples, um atestado de óbito, demorou mais de duas décadas para chegar nas mãos da família de Rubens. Nos faz pensar também que até hoje, com 60 anos do início do golpe, muitas famílias ainda seguem sem respostas sobre o desaparecimento dos seus entes que também foram vítimas de tortura e assassinato ocorridos no período da ditadura.

Fernanda Montenegro

Reprodução: Ainda Estou Aqui

Ao final do filme, a excelentíssima Fernanda Montenegro interpreta Eunice na velhice. Em decorrência do alzheimer, ela está de cadeira de rodas e não se comunica como antes.

Nessa cena, ela se encontra em frente à uma televisão, que passa uma reportagem sobre o aniversário do Golpe e ao final são mostradas imagens de algumas figuras que foram assassinadas. Com isso, a foto de Rubens Paiva aparece na tela.

Mesmo sem dizer uma palavra, a atriz descarrega uma complexidade de sentimentos com o resquício de memória do marido apenas com o olhar.

Assim como sua filha Fernanda Torres disse em uma entrevista recente, Fernanda Montenegro carrega na sua feição todas as personagens que ela teve em sua trajetória como atriz. A emoção que um telespectador brasileiro sente só de olhar para ela é indescritível.

(Bônus) Tenho saudade de tudo.

Reprodução: Central do Brasil

O momento em que Eunice, interpretada por Fernanda Torres lê em voz alta uma carta que termina com “Sinto saudade de tudo”.

A mesma frase foi escrita pela personagem de sua mãe, Fernanda Montenegro, em Central do Brasil, clássico da cinematografia brasileira. Uma homenagem sutil que derrete o coração de quem pega a referência na cena.

Ainda Estou Aqui entrou para o topo da minha lista de melhores filmes de 2024. Não só pela excelente produção mas também por toda a sua importância para a cultura brasileira. Se você ainda não assistiu, corre que ainda está em cartaz!

Leia Também

Perfil: Fernanda Montenegro

Top 5 | Séries Brasileiras para assistir no Globoplay

Da missão Marte Um para o Cinecom

Comentários

Autor