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Por que amamos e o que as produções românticas nos mostram sobre o amor?

O amor é e parece sempre ter sido um sentimento complexo e indescritível, e nesse artigo confirmaremos as muitas nuances desse sentimento tão discutido e representado na sétima arte

Este artigo contém spoilers sobre as seguintes produções: A Barraca do Beijo (2018), O casamento de Romeu e Julieta (2005), Perfeita pra você (2018), Até o último homem (2016), Como eu era antes de você (2016), O melhor de mim (2014), Um Dia (2011), Juntos pelo acaso (2010), O despertar de uma paixão (2007), Orgulho e preconceito (2005), Alguém Especial (2019).

Em busca de respostas sinceras e reais, questionei aos meus amigos quais eram as coisas que os faziam se apaixonar por alguém. As respostas, de pessoas diferentes umas das outras, foram também diversas. Alguns apontaram um alguém com gostos, projeções e ideologias parecidas, alguém com quem se possa conversar abertamente sobre tudo, outros apontaram para atributos físicos; houve ainda aqueles que indicaram um alguém que lhes ofereça segurança o suficiente para ultrapassar desafios e barreiras pessoais, como a dificuldade em confiar em alguém.  Surgiram também questionamentos quanto as formas de amar, por serem apaixonados por artistas que nem mesmo nunca viram ou times de futebol. 

Somos incentivados desde a infância a acreditar no amor nas mais diversas formas, o amor familiar, o amor pelos animais, o amor por uma crença, e principalmente em um amor romântico. É sobretudo sobre esse amor que trataremos aqui, o amor pelo seu par e as exemplificações e representações nas produções românticas. Nas telinhas, na maioria das produções do gênero tudo é lindo, ou no fim as coisas sempre acabam bem, quando isso não ocorre, o público costuma não sair satisfeito. Na prática as coisas podem acabar não sendo tão fáceis quanto trombar com alguém em um corredor, se abaixar para juntar as coisas e quando suas mãos tocarem, descobrir que é essa pessoa o amor da sua vida.

No dicionário, o amor está definido como forte afeição por outra pessoa, nascida de laços de consanguinidade ou de relações pessoais; ou como atração baseada no desejo sexual. Por mais que todo mundo sinta ou já tenha sentido em algum momento, nunca se conseguiu explicar ao certo o que é o amor. Milhares de músicas ao longo da história, poemas, livros, todos tentando exprimir ao certo o que é amar alguém. A verdade é que existem diferentes formas de amar e diferentes formas de amor que permeiam a vida dos seres. No vocabulário grego, três palavras diferentes definem esse sentimento e os coloca em categorias: Eros, Philia e Ágape. 

O primeiro deles, Eros, é sobre aquele amor irresistível, com forte impacto do platônico, no desejo daquilo que nos falta. Encontra-se também no carnal, no erótico. Em A Barraca do Beijo (2018), Elle (Joey King) e Lee (Joel Courtney) são melhores amigos e criaram uma lista de regras para preservar esse laço, e a regra número 9 consiste em não se envolver amorosamente com qualquer parente do outro. Logo, o irmão gato de Lee, Noah Flynn (Jacob Elordi), se torna figurinha proibida no álbum da protagonista, e nós sabemos como essa história termina. Não apenas Elle se apaixona por Noah, mas o sentimento é recíproco, e vale lembrar que o irmão mais velho sabe das regras dos dois amigos. Não saberemos se o fator proibido, carnal, foi o único ponto definidor desse romance, mas observando pela ótica do amor Eros, é fácil acreditar que o elemento de proibição influenciou no resultado dessa relação. Outro exemplo podemos encontrar no longa brasileiro O casamento de Romeu e Julieta (2005), que conta a história de Julieta (Luana Piovani), torcedora fiel do Palmeiras principalmente pela influência do pai, Alfredo (Luis Gustavo), um senhor totalmente fanático pelo time de futebol paulista; e Romeu (Marco Ricca), um médico líder da torcida do Corinthians que é apenas o principal rival do Palmeiras. E não poderia ser diferente, nesse caso o fator proibido também grita, e mesmo com as prováveis confusões que esse romance entre dois rivais poderia acarretar, tanto Julieta quanto Romeu não são capazes de resistir. A partir daí, é história.

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Philia, por sua vez, trata-se de uma espécie de amor mais calmo, sereno,no qual não existe um sentimento de posse sobre o outro. Segundo Aristóteles, é nesse amor que deveríamos basear nossas relações, por representar uma linha horizontal entre as pessoas. Em Perfeita pra você (2018), Abbie (Gugu Mbatha-Raw) e Sam (Michiel Huisman) acreditam ter encontrado o grande amor de suas vidas nos braços um do outro, até que Abbie descobre um câncer terminal. Mais que os medos e desafios que encontra no processo de aceitar a doença e no tratamento, nossa protagonista se vê extremamente preocupada com o futuro do marido, quando não estiver mais ao seu lado. É quando começa a planejar o futuro do companheiro e cria um perfil online para encontrar alguém que seja perfeita para o fazer feliz. 

O filme traz várias questões complexas, mas o ponto que trago a ser abordado aqui é o fato de Abbie passar por cima de seus medos e de seu amor para buscar um outro alguém para estar ao lado do homem que amou desde a infância. Não é sobre suas atitudes estarem certas ou não, mas sobre o sentimento de amar tanto alguém ao ponto de passar por cima do próprio orgulho e ego pensando em seu bem-estar.

Com relação ao amor não necessariamente direcionado aos relacionamentos amorosos, Até o último homem (2016) traz uma perspectiva mais humanista. Conta a história de Doss (Andrew Garfield), que decide servir ao exército dos Estados Unidos Da América durante a Segunda Guerra Mundial mas com a condição de não pegar em armas. A dedicação e fidelidade a sua religião e suas crenças, e principalmente pelo desejo de salvar vidas, mostra a pureza desse seu amor, no contexto no qual o protagonista arrisca sua vida inúmeras vezes com o intuito único de ajudar.

Ágape, por fim, é o amor sem interesses, em que se faz pelo outro independente das consequências, amor pelas imperfeições, e que é provavelmente o mais raro. Em Como eu era antes de você (2016) a tetraplegia de Will (Sam Claflin) nunca fora um problema para Louisa (Emilia Clarke), que se apaixona por ele após ser contratada como cuidadora. Nela, as roupas diferentes e esquisitas, e todas as pequenas coisas de sua personalidade que o irritava também o fizera se apaixonar, não sendo elas de fato um problema, De ambos os lados, era um amor pelas imperfeições.

Já em O melhor de mim (2014) Dawson (James Marsden, como jovem; Luke Bracey, como adulto) e Amanda (Liana Liberato, como jovem; Michelle Monaghan, como adulta) se apaixonam na adolescência e veem seu amor enfrentando os mais diversos desafios até que por fim o destino os separa, mas não seus corações. Quando se encontram anos depois, com as vidas totalmente mudadas, o sentimento permanece o mesmo. Dawnson é aquele que dá tudo de si a ela, como sempre dera, enquanto Amanda se vê no dilema entre priorizar sua família ou reatar com o amor de sua vida. São realidades e desafios diferentes dos personagens, mas fica claro que todas as coisas que Dawnson faz por Amanda, não são com a intenção de receber algo de volta, mas sim por simplesmente amá-la incondicionalmente.  

Os tipos de amores, porém, não são excludentes, mas o que se acredita comumente é de que o balanceamento dos três é peça importante para se alcançar a plenitude do ato de amar.

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Buscando entender um pouco mais sobre esse sentimento tão complexo, podemos analisar o amor por três óticas, sendo a primeira delas a neurociência. E não é exagero, de fato, no cérebro, se apaixonar tem o mesmo efeito de usar uma droga pesada. Sente-se prazer com maior facilidade, e também por isso romper um relacionamento é tantas vezes extremamente desgastante. Em Um Dia (2011), Dexter (Jim Sturgess) e Emma (Anne Hathaway) são amigos por anos e demoram um bom tempo para assumirem que são apaixonados um pelo outro. Quando começam a construir uma vida juntos, como um golpe trágico do destino, ela morre em um acidente de carro. As cenas apresentadas pelo longa de Dexter após a morte da mulher que ama são absolutamente deprimentes e comoventes. Ele não apenas perde alguém que ama como em uma separação, mas precisa lidar com o peso do luto, de vê-la sendo arrancada de seus braços sem qualquer previsão de devolução. Sua droga é tirada para sempre e não existe outra opção que não lidar com a abstinência.

Outra ótica pela qual podemos observar o amor é pela biologia. Nesse conceito, o sentimento é visto como uma consequência da evolução da humanidade. Bebês são naturalmente frágeis e precisam de cuidados básicos para sobreviver, para isso nossos cérebros vem programados para defender os pequeninos de olhos grandes e bocas pequenas. Sendo assim, é como se a natureza se certificasse de que duas pessoas se unissem amorosamente para garantir a sobrevivência da espécie. Vemos algo parecido em Juntos pelo acaso (2010), onde Holly Berenson (Katherine Heigl) e Eric Messer (Josh Duhamel) ficam responsáveis por criar juntos a pequena Sophia, filha de seus melhores amigos, que acabam falecendo em um acidente fatal. Apesar das diferenças nas personalidades e no modo de vida dos dois, com o tempo as coisas começam a funcionar e como o esperado, acabam se apaixonando um pelo outro. Se não tivessem sido unidos por esse acaso e pela necessidade de criar a criança, será que de fato eles seriam levados um para o outro?

O despertar de uma paixão (2007) Walter Fane (Edward Norton) e Kitty (Naomi Watts) se casam por motivos convencionais para a década de 60. Ele, levado pela beleza da moça, ela devido às imposições sobre as mulheres na época e seduzida pelo comodismo. Quando Walter descobre a traição da mulher, os dois partem para uma vila na China que fora devastada pela Cólera, onde o protagonista oferecerá seus serviços como médico. Juntos, eles embarcam nesse desafio duro em uma realidade extremamente difícil, e é onde não a paixão, mas o amor desperta. Nesse caso, o amor nasce de uma relação construída, e o sentimento flui a partir da admiração e respeito que um passa a sentir pelo outro perante as situações que ali vivem juntos.

E por fim, mas não menos importante, a cultura. Temos diferentes tipos de concepções de amor, relacionamentos monogâmicos, relacionamentos abertos e muitos outros. Por que amamos: O que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor, de Renato Noguera, traz a teoria de que o amor é uma diplomacia. Amar e viver um relacionamento com alguém teria mais a ver com hospitalidade, já que se trata do encontro de duas culturas.

Orgulho e preconceito (2005) exemplifica isso de forma clara, a partir das diferenças não apenas financeiras entre Senhor Darcy (Matthew Macfadyen) e Elizabeth Bennet (Keira Knightley). No início, os dois são apenas provocações e implicância, e apenas quando decidem abrir os olhos e a mente para a realidade do outro é que conseguem então se relacionar.

Quando a onda da paixão passa, é comum achar que a pessoa mudou, mas talvez o que tenha de fato mudado é a sua percepção sobre ela e suas atitudes e gostos. É o que vemos em Alguém Especial (2019), acompanhando Jenny (Gina Rodriguez) na busca por superar o término de seu relacionamento de anos. Ela e as duas melhores amigas embarcam em uma noite por Nova York na qual conversam sobre seus relacionamentos e suas vidas em geral, e por boa parte vemos como nossa protagonista está quebrada por ter perdido seu alguém especial que a quem acreditava conhecer como a palma de sua mão.

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Fato é que somos expostos às mais variadas experiências amorosas ao longo de nossas vidas, algumas incríveis, outras nem sempre tão boas, e mesmo com as dores e dificuldades que se apresentam, continuamos nos aventurando nesse sentimento tão louco.

O amor pode ter várias interpretações, e entre elas uma das constantes talvez seja aceitar que ele não é algo evitável ou que possa ser controlado, medido. O amor talvez seja a única coisa capaz de salvar o mundo e a própria significância dos seres humanos, algo que nos possibilita nos sentir vivos… Cada um na sua forma, no seu jeito, com as suas crenças e desejos, a esperança é acreditar que há amor no mundo para tudo e para todos.

Este artigo foi inspirado no livro Por que amamos: O que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor, de Renato Noguera. E no vídeo intitulado ‘’Por que a gente ama?’’ do canal Ludoviajante.

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