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Crítica: 22 de Julho

Quando o extremismo político faz vítimas e o horror dessa realidade é derramado em nossas telinhas

No dia 22 de Julho de 2011, uma bomba explodiu nos prédios do governo em Oslo, capital da Noruega, matando oito pessoas. Á aproximadamente 40km dali, na ilha de Utøya, mais de quinhentas pessoas estavam reunidas em um acampamento jovem organizado pelo Partido Trabalhista Norueguês. O intuito do acampamento ia além de divertir esses jovens com canções ao redor da fogueira e interações, mas se tratava também de os levar a refletir sobre o mundo em que gostariam de viver no futuro, e como isso poderia se concretizar a partir da política. Contariam, inclusive, com um discurso do Primeiro Ministro, Jens Stoltenberg, que acabou não acontecendo.

Enquanto os olhos do país se voltavam para as consequências da explosão da bomba,  o responsável pelo atentado se preparava para a segunda parte de seu plano. Anders Behring Breivik, se passando por um policial designado a proteger os jovens na ilha de Utøya, consegue acesso à mesma, e munido com armas de fogo inicia um massacre que acabaria com 77 mortos e centenas de feridos.

Essa tragédia é contada nos primeiros momentos do longa metragem 22 de Julho, dirigido por Paul Greengrass e produzido pela Netflix. O filme é baseado em fatos reais e nos é apresentado por três óticas diferentes, sendo uma delas não tão aprofundada. A primeira, sob o olhar de Viljar Hanssen (Jonas Strand Gravli), que está na ilha com seu irmão Torje Hanssen (Isak Bakli Aglen), os dois sobrevivem ao ataque, mas depois de ser alvejado com cinco disparos, Viljar precisa lutar por sua vida e aprender a viver com as sequelas desse dia traumático.

No segundo, conhecemos melhor o assassino Anders Behring Breivik (Anders Danielsen Lie), que é claramente um extremista de direita com ideais de supremacia branca. Ele não vê problema em afirmar que defende a Independência da Europa e a proibição da imigração, pelo contrário, faz questão de que todos saibam os seus motivos para que se sintam inspirados a lutar pelo mesmo.

E em uma terceira ótica, não tão explorada, vemos a reação do Ministro Jens Stoltenberg (Ola G. Furuseth) e do governo da Noruega diante do atentado, mas como o filme não foca apenas em uma narrativa, essa acaba por ser a menos desenvolvida, passando apenas uma ideia superficial do político com a mídia e com o atirador.

Com o decorrer do filme não resta dúvidas quanto aos conceitos nazista de supremacia que o personagem Anders – obviamente inspirado no assassino real – carrega como crenças. Somos obrigados a ouvir e involuntariamente tentar entender o que se passa na cabeça do mesmo, vendo e ouvindo seu discurso de ódio despejado com uma crença quase doentia.

É preciso entender, porém, que o filme não é necessariamente sobre o atentado em si, mas sobre os conflitos e as marcas que ele deixa. Nos primeiros momentos somos introduzidos a cenas de ação onde os tiros, os gritos de desespero dos jovens nos deixa em completa tensão. As cenas do ataque em si conseguem encher o espectador do pânico vividos pelos personagens enquanto correm por suas vidas, dando destaque ao contraste da beleza do lugar com o horror do momento. A realidade e intensidade dessas cenas podem ser extremamente perturbadores, principalmente quando nos lembramos que os fatos ali narrados realmente aconteceram. 

O que pode não agradar a todos é o fato do filme não seguir a velocidade de narrativa padrão que estamos acostumados. Isso pode vir a causar alguma frustração, pois a partir da primeira cena de pura adrenalina, nas horas seguintes o ritmo desacelera consideravelmente e somos apresentados as consequências do ataque. 

A divisão dos pontos de vista e principalmente a dualidade entre a visão do sobrevivente ao massacre e o causador do mesmo, é quase inebriante. Vemos em sequência a causa e o causador, o que faz o telespectador experimentar um sentimento controverso, já que vemos o acusado dando depoimento conseguindo regalias como pizza, refrigerante e ter acesso aos jornais, enquanto do outro lado vemos Vlair sendo obrigado a lidar não apenas com a dor física, mas os traumas psicológicos de alguém que sofrera algo que provavelmente jamais esquecerá. De um lado, um assassino que tenta a todo custo cumprir algo que em sua cabeça era uma missão de extrema importância. Do outro, um garoto que luta para ter sua vida de volta após quase a perder devido as escolhas de outra pessoa. 

O julgamento certamente é outro ponto alto do filme, que nos faz refletir quanto ao rumo que a sociedade, em geral, virá a tomar com a educação que está sendo dada às novas gerações. Finalizando com um discurso cheio de emoção e sinceridade de Viljar Hanssen em frente Anders Behring Breivik, seu quase assassino, 22 de Julho nos deixa não apenas uma lembrança de que o ódio mata e deixa feridas incuráveis, mas um alerta de que o amanhã precisa ser diferente. E que para isso, é preciso que sigamos com responsabilidade, tolerância e esperança.

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