Você consegue adivinhar qual é o pior pesadelo de toda mulher?
Produções que abordem o tema vingança são um marco no cinema há algum tempo e todos os anos filmes com esta temática em variados subgêneros são lançados. Então, o que faz Bela Vingança ser diferente? Por que é tão bom?
Indicado a 87 prêmios, dos quais ganhou 32, Promising Young Woman ou no português brasileiro Bela Vingança, deixou os fãs de cinema empolgados desde que o trailer apareceu pela primeira vez e trouxe à luz um assunto preocupante, trazendo o melhor da diretora e dos atores, em especial a estrela do longa. O drama apresenta um frescor em relação ao conceito de filmes de vingança, abordando questões que permeiam nossa sociedade de forma madura, gerando discussões e reflexões.
A produção escrita, dirigida e co-produzida por Emerald Fennell, segue uma jovem não muito promissora chamada Cassandra Thomas (Carey Mulligan) que abandonou a escola de medicina e, agora, trabalha em um café enquanto ainda vive com os pais. Na superfície, uma mulher normal, angelical – assim como é apresentada, sempre utilizando cores claras, pouca maquiagem e de personalidade meiga.
Entretanto, à noite, ela vai a bares aparentemente alcoolizada – toda sua aparência muda, desde roupas e maquiagem a postura e o semblante – e espera que algum homem ofereça “ajuda” ao levá-la para casa com a esperança de que ocorra algo entre os dois, e é nesse momento que Cassandra revela não estar nem um pouco alterada e… sem spoilers, você precisa ver o que acontece.
Seus atos são parte de um plano maior de justiça após um incidente traumático envolvendo sua melhor amiga. Quando ela se encontra e estabelece uma conexão com um velho amigo, Ryan Cooper (Bo Burnham), novas informações vêm à tona e faz com que ela se dedique ainda mais ao seu plano.
O drama aborda toda a questão do consentimento, do julgamento em relação às vítimas de violência, o padrão desses acontecimentos, a omissão daqueles ao redor e a cumplicidade entre os homens. Um ponto marcante e bastante original no filme são os momentos divertidos e cômicos, ao abordar traumas do passado e a violência contra mulheres de forma tão autêntica, a obra gera em nós raiva e frustração, e esses pequenos momentos nos permitem respirar em meio ao caos de emoções. A criatividade permeia toda a produção, deste os momentos supracitados a escolha da trilha sonora e os toques visuais, por vezes, chocantes.
Isso, de maneira alguma, quer dizer que o filme deixa de ser profundo. Ademais de toda a violência, se preocupa em examinar os efeitos que essa causa em suas vítimas e naqueles que as cercam. E todas essas perspectivas são essenciais para o que o filme propõe.
A escolha dos personagens secundários é impecável, atores como Adam Brody e Christopher Mintz-Plasse – conhecidos por seus papéis em comédias e romance – interpretam homens “legais” e aparentemente inofensivos, mas que tentam se aproveitar da protagonista. Todo o elenco coadjuvante apresenta performances sólidas, contudo, a atuação que realmente se destacou e pode ser considerada um dos melhores desempenhos daquele ano pertence a Carey Mulligan. A personagem interpretada por Mulligan é extremamente complexa, ora ameaçadora, hilária ora doce e comovente, e ela brilha no papel.
Mesmo ao utilizar um subgênero muito recorrente, a produção é imensamente original e coerente, o filme explora questões sociais proeminentes de forma atenciosa e consegue manter os cinéfilos fascinados e entretidos durante os 113 minutos de duração. Essa crítica não pretende dar spoilers, mas destaco que os minutos finais são excepcionalmente importantes e seu desfecho cruel é profundamente necessário, causando assim o impacto pretendido.
Perfeito do início ao fim e muito surpreendente, se você não viu o filme, faça um favor a si mesmo e vá logo ver! Termino com uma citação para, espero, te fazer refletir: Um dos alvos argumenta “é o pior pesadelo de todo homem ser acusado de algo assim” ao que Cassie responde “você consegue adivinhar qual é o pior pesadelo de toda mulher?”.
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