Você está visualizando atualmente Fantasmas de tempos passados.

Fantasmas de tempos passados.

Um texto sobre fantasmas – e não aqueles que usam lençóis brancos e atravessam paredes, mas sim fantasmas de nosso passado.

“Nenhum organismo vivo é capaz de existir com sanidade sob condições de absoluta realidade”. É com essa frase que se inicia A Maldição da Residência Hill, série escrita e dirigida por Mike Flanagan. E ela representa muito do que veríamos a seguir. 

A série começa de maneira bem simples, e até mesmo clichê: uma família se muda para uma casa mal assombrada, e coisas estranhas começam a acontecer. A Maldição da Residência Hill tinha tudo para ser como os milhares de filmes e séries do gênero, mas ela decide ir além, e abre a premissa do que acontece depois. Misturando períodos passados e presentes, a série trabalha em como essa família lida com os acontecimentos da época em que viveram naquela casa.

E, realmente, cada um lida à sua própria maneira. Seja tentando se entorpecer com uso de drogas, convivendo com doenças psiquiátricas ou até mesmo comercializando os horrores do passado, cada membro da família Hill aprende a lidar com seus traumas. Isso não significa que seus mecanismos estão funcionando.

Vemos aqui um conceito muito interessante. Apesar dos personagens terem sido, literalmente, assombrados por fantasmas no passado, eles não saíram de lá. Os espíritos presentes na Residência Hill não saem para passear, eles continuam presos naquelas paredes, seus murmúrios seguem ecoando pelos mesmos corredores, sem salvação. Mas os fantasmas que continuam a perseguir essa família não são literais.

“Fantasmas podem ser muitas coisas. Uma memória, uma fantasia, um segredo… luto, raiva, culpa. Mas na minha experiência, quase sempre eles são só o que nós queremos ver”
Reprodução: Netflix

Fantasmas serem retratados como assuntos inacabados não é uma novidade. Clássicos como Um Conto de Natal, de Charles Dickens, já trazia três espíritos que representavam o passado, o presente e o futuro. Eles se caracterizavam pelo luto, pela angústia, pela saudade, pelo medo, pela culpa. A proposta em Hill House é semelhante.

E não se trata disso a nossa vida? Um amontoado de sentimentos que insistem em nos assombrar? Memórias que gostaríamos de esquecer, e momentos que daríamos tudo para viver de novo. Pode ser um arrependimento de algo que nunca foi dito, a culpa por um erro cometido, um segredo escondido a sete chaves. Ou até mesmo um desejo, um apelo, uma vontade angustiante que surge em nossos sonhos como fantasmas no escuro. Muitas vezes, fantasmas são só o que nós queremos ver.

E como podemos lidar com esses fantasmas? A resposta encontrada em A Maldição da Residência Hill é o amor. Esse sentimento que nos ajuda a perdoar mágoas, superar culpas, aceitar o luto e amenizar a raiva. Não se pode lutar com seus fantasmas sozinho, o amor e o companheirismo sempre estão presentes. Nascemos sozinhos e morremos sozinhos, mas, ao longo desse percurso chamado vida, estamos sempre na companhia de quem amamos. E isso é tudo o que importa. O resto é só confete.

A série finaliza com uma frase parecida com a do início. “O amor é o abandono da lógica. Sem ele, não somos capazes de existir com sanidade sob condições de absoluta realidade”.

Leia também:

Presos no tempo finito e na mortalidade

Qual o caminho para a Terra do Nunca?

Tudo que temos é um para sempre e um nada

Chamada: A Maldição da Residência Hill reinventa um clichê, e traz uma reflexão sobre nossos fantasmas do passado. Esse texto é sobre esses fantasmas.

Comentários

Autor