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Não é só sobre o Babu

 Sabemos que o Big Brother é um reflexo das sociedades em que é transmitido, portanto, não é surpresa que o BBB mostre inúmeras formas veladas de preconceito

Sabemos que o BBB tem movimentado nossas conversas online. Todos os dias os acontecimentos na casa mais vigiada do Brasil entram nos trending topics, pautam nossas conversas pessoais e são assunto do dia desde a maquiagem usada pelas sisters até as discussões levantadas pelos próprios participantes. Conflitos geracionais, machismo, gordofobia, homofobia, o BBB tem sido vitrine para alguns dos assuntos mais pautados pela nossa sociedade.

E não é diferente com o racismo. No Brasil, país onde a população negra ainda é minoria nas universidades, maioria nos presídios e ganha salários menores do que seus pares brancos, a discussão do racismo precisa e é levantada mesmo no Big Brother. Duas figuras despontaram sobre o assunto no programa, os únicos dois negros da edição, Thelma e Babu.

Thelma é médica e aparece do lado dos que eram anônimos do cast e Babu é ator renomado e está do lado dos famosos. Dentro da casa suas participações são marcadas por polêmicas principalmente pelo fato de ambos serem excluídos e preteridos dentro da casa.

Ninguém dentro da casa nunca se levantou e apontou o dedo para eles expondo: “sim, é por causa da cor da pele”, mas isso não significa que não seja preconceito, é uma amostra daquilo que a TV brasileira faz constantemente: racismo velado usado de maneira recreativa.

Quando uma participante fala ”acho esteticamente bonito casais que a cor combina”, ou “o que é isso aqui?” em tom de deboche para o pente de cabelo afro, ou quando numa brincadeira sobre o que cada participante seria numa escola “Babu é o cara da cantina”. Essas falas são, a vista de quem fala, inocentes. Ninguém ali está conscientemente fazendo referência a questão eugenista no Brasil, não estão diminuindo os artefatos ligados a cultura negra ou distribuindo papéis a partir da raça. Ninguém está fazendo isso de caso pensado, pelo menos é o benefício da dúvida que damos, mas a questão é: estão fazendo isso, é exatamente sobre isso que estão falando.

Quando Babu fala que os olhares que recebe no reality são iguais aos que recebia de sua patroa é porque são os mesmos olhares e a mesma motivação. Racismo. Num país onde todos somos racistas.

O fato de não ser a representação do racismo que  nós, racistas, entendemos como o verdadeiro preconceito, não significa que não seja. O racismo no Brasil na maioria das vezes não é escrachado e na TV ele é velado e escondido em nome do entretenimento. Piadas que remontam a sexualização dos corpos negros, jornalistas categorizando situações negativas como “coisa de preto”. A tradição do preconceito é micro, não está escancarada, e é dividida em três agressões: microassaltos, microinsultos e microinvalidações.

Quando Marcela diz que prefere ficar na xepa se Babu estiver no vip é um microassalto, ela está se negando a estar ao lado dele porque, em seu julgamento, é superior. Quando as mulheres no quarto riem dizendo “eu nunca vi isso aqui” para o pente garfo, é um microinsulto, um símbolo da cultura negra está sendo desprezado justamente por vir de onde vem. Quando Babu sente que foi escolhido por último em uma prova e vai confrontar os outros participantes sobre isso e eles viram as costas, é uma microinvalidação. O racismo está acontecendo bem diante dos nossos olhos, velado, mas ainda assim nocivo.

Para nós, que estamos assistindo BBB de olhos bem abertos a cada movimento, essas violências não podem ser esquecidas. Nenhuma delas. Não nos basta pensar que aquilo não está certo, mas projetar e educar a nós mesmos as implicações daquilo porque a máxima de Angela Davis deve nos guiar “não basta não ser racista, precisamos ser antirracista”. Não é só sobre o Babu.

MOREIRA, Adilson. Racismo recreativo. Pólen Produção Editorial LTDA, 2019.

 

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