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O Isolamento Domiciliar e as Reprises

Com as pausas nas gravações das séries é hora de assistir os clássicos da TV. Mas o que fazer quando o clássico tem um preconceito embutido?

 

A Pandemia de Covid-19 tem afetado todos os aspectos da nossa vida, estamos todos (ou quase todos) em casa em isolamento domiciliar. Com tempo sobrando acabamos nos voltando para as produções cinematográficas. É hora de colocar nossos filmes, séries, novelas e animes em dia, mas diferente de todos os momentos que tivemos anteriormente para fazer isso (feriados, férias, finais de semana) esse momento de isolamento tem uma coisa que dificilmente vimos antes: coisas novas não estão sendo produzidas e por muito tempo não serão. 

Euphoria, Um Lugar Silencioso 2, Grey’s Anatomy, NCIS, Lucifer, Supernatural, a lista de produções que pararam a gravação ou adiaram o lançamento é enorme e, além disso, pela primeira vez em muito tempo, as gravações de todas as novelas que estão no ar foram suspensas. Temos que nos voltar então para os filmes, séries e novelas que já estão disponível, as vezes as mais velhas. 

Nesse cenário algumas discussões cresceram principalmente quando a novela “Fina Estampa” de 2012-2013 foi anunciada para entrar no lugar da arrojada “Amor de Mãe” no horário nobre da Globo. A história parece muito com os outros folhetins, conta a história de Griselda, uma mulher que faz trabalhos considerados masculinos para viver e que do dia para noite fica milionária e divide, classicamente, lugar com os outros núcleos dos personagens como o dos ricos de nascença. 

A história tão divertida e que fez tanto sucesso na época foi recebida com críticas em 2020 principalmente pelo personagem “Crô”, que na época ganhou até filme próprio. O personagem de Marcelo Cerrado é um homem homossexual que é basicamente o faz tudo de Tereza Cristina, interpretada por Cristiane Torlone, uma mulher rica e poderosa. O que mais chamou atenção foi a maneira estereotipada como o personagem é construído, sua fala é exagerada, os trejeitos típicos, sempre em situações cômicas e aparece literalmente massageando os pés de sua patroa hétero. 

E a gente nem precisa se voltar para as novelas para enxergar isso, as piadas sobre a forma física de Mônica em Friends, o primeiro arco de Eu, a Patroa e as Crianças que é basicamente o Michael tentando impedir Jay, sua esposa, de continuar trabalhando ou então nos livros que as editoras colocaram gratuitos nas lojas online, Reinações de Narizinho que é um show de racismo para crianças. 

Os mais extremistas dizem que a gente tem que abolir, rejeita e, como tá na moda, cancelar esse tipo de produção cujos preconceitos não são vistos com tranquilidade na nossa época. Mas se a gente der um passo para trás e olhar o todo vamos ver que essas produções dizem sobre a época em que foram feitas e são recortes para os quais a gente tem que olhar para entender aquele e o nosso tempo. 

Não temos que cair no anacronismo, colocar os valores de agora em cima dos valores daquela época, mas ver essas produções com olhar crítico de entender de onde, de quem e de quando falam e reconhecer também as suas contribuições. Fina Estampa foi uma das primeiras novelas a tratar do assunto de violência doméstica, Eu, a Patroa e as Crianças conta essencialmente a história de sucesso de uma família negra americana, Friends nos anos 90 tratava de uma configuração familiar diferente com Ross, Carol e Susan cuidando de Ben, e a versão grátis online de Reinações de Narizinho da Companhia das Letras conta com notas de rodapé de Emília e Narizinho corrigindo os racismos do autor e ensinando, com linguagem direcionada às crianças, porque aquelas falas são problemáticas. Nos cabe consumir essas produções com cuidado e entendendo de onde elas partem.

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