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Presos no tempo finito e na mortalidade

Como estamos ignorando nossa própria morte e a inexistência de versões nossas que nunca verão a luz do dia

Observando o dia passar e me perdendo em um fluxo de pensamentos, me encaro e chego na conclusão que tenho 21 anos, e não sei responder se é muito ou pouco tempo. Apenas sinto um certo desespero, não, uma mudança, algo tão drástico que muda minha percepção sobre o próprio mundo. Aquela sensação de ser imortal, que nada é capaz de me atingir e que todo o tempo do mundo é meu, aquele ar de adolescente, começou a desaparecer.

Não consigo apontar quando essa mudança começou, mas apenas sei que ela surgiu, e me vejo pensando na minha própria mortalidade e assim, também penso na mortalidade das pessoas que eu amo. Na realidade, de todas pessoas que existem.

Alerta gatilho: uma reflexão aprofundada sobre, vida, medo da morte e existencialismo segue a partir daqui, o que pode ser um tópico delicado à um leitor sensibilizado. Esperamos que todos se cuidem, se preservem da leitura caso necessário e tirem apenas coisas boas desse artigo 🙂

Todos nós, em algum nível, em algum lugar, em alguma etapa de nossas vidas, estamos tentando alcançar algo, uma posição, um sonho, ou apenas estamos tentando ser o suficiente para nossas famílias, tentando provar o valor que temos, apenas alcançando metas. E isso tudo é tão importante, mas acabamos esquecendo no meio do caminho de olhar para o fim da vida.

Apesar de não sabermos exatamente quando ela ocorrerá, sabemos que ela chega. Para alguns mais tarde, outros mais cedo, somos todos ligados pelo mesmo destino. O último capítulo de nossas vidas não será original; na verdade, será bem clichê: todos vamos terminar com a morte nos alcançando, mas parece que vivemos tentando negar essa realidade. Talvez por ser mais fácil de viver nossas vidas assim, por ser menos doloroso ou apenas por não sermos capazes de compreendermos o fato de já nascemos com tempo limitado.

Não vou ser hipócrita, eu fico paralisado com a hipótese da morte. Torço para os anos passem e, quando eu menos perceber, me tornei um idoso de 80 anos que viveu uma vida inteira, com uma trajetória, um livro de memórias e todo o tempo do mundo para contá-las. Mas sabemos que nossas vidas não seguem um plano. As coisas acontecem e basta um único segundo para tudo virar de ponta cabeça, para os nossos pulmões não encontrarem mais o ar.

Difícil dizer com exatidão o que tanto me assusta. Não acho que seja o mistério da morte – para onde vamos, Deus? Paraíso? Reencarnação? -. Nada disso realmente me importa, vamos todos descobrir a reposta em algum momento. O que verdadeiramente me machuca é o egoísmo em si desse medo de morrer.

De desapegar, aceitar que algumas coisas vão ocorrer sem minha presença, que vou ser esquecido em alguns momentos e, quem sabe, depois lembrados. Aprofundando mais nessa reflexão, pensar que pessoas vão sofrer pela minha ausência e não vou ser capaz de curá-las, de secar suas lágrimas, e que não vou ter mais memórias, abraços, beijos, pôr do sol … que tudo que ainda quero fazer, ver, sentir, simplesmente presenciar e existir, será arrancado.

Reprodução: A Maldição da Residência Hill- NETFLIX © 2020 (Divulgação)

Imaginar não ter o futuro que eu tenho planejado me dói, não observar todos que eu amo crescer e envelhecer, suas conquistas, suas derrotas, suas dores e alegrias … é um grande egoísmo, mas é aquilo que mais me apavora. Quero todo o tempo do mundo para ser grato por existir, para amar, para viver. Nessa de ignorar o tempo curto, é fácil esquecer um clichê mais do que batido: apesar dos planos que estamos fazendo, a vida não é um roteiro. Ela não joga nas nossas regras, não pega nossas dicas e muitas vezes não faz sentido nenhum. Pode até mesmo ser cruel e dolorosa, afinal, é o peso de viver, porém, quando aceitamos isso, quando largamos essa luta impossível pelo controle, podemos apenas fazer tudo aquilo que importa.

Pode lutar por objetivos, criar planos, sonhe o quanto for possível, mas também abrace o fato do imprevisível, do acaso, do fato de não termos tanto tempo quanto imaginamos. Esteja presente nos momentos, olhe nos olhos das pessoas, diga “eu te amo“, abrace, beije, torne cada momento real. Olhe ao seu redor, sinta o sol e sinta a dor também, sinta tudo que nosso corpo é capaz de nos proporcionar.

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Reprodução: Internet

Perceba o quão vivo você está e o quão maravilhoso é isso. Lute por cada pequeno momento, e seja honesto consigo mesmo: sua vida é apenas sua, não tente viver na regra de outra pessoa, crie sua própria marca. Tome seu sorvete favorito, seja carinhoso com outros e com você, dance, mesmo que seja apenas com você em uma sala vazia, escute suas músicas preferidas, reveja um filme apenas por rever, apenas faça sua lista de coisas favoritas, enfim, tudo nos lembram o quão grato somos por acordarmos.

Tudo é tão frágil, tão passageiro … nunca vamos ter tempo o suficiente, pois o tempo passa cada vez mais rápido e teremos cada vez menos momentos para vivermos, mas isso também torna tudo um pouco mais raro.

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Reprodução: Barbie (2023)

Esse texto é uma carta para todos nós que temos grandes planos, que colocamos nossa mente quase sempre no futuro e esquecemos do presente. Que sejamos capazes de ver que ele é tudo que temos, tudo que é nosso.

O futuro foge do nosso alcance, ele vive em uma regra desconhecida para os humanos, ou seja, aproveite aquilo que verdadeiramente é nosso, o agora. Uma das coisas mais puras que somos capazes de fazer, uma frase que sempre ficará comigo e me lembra do peso da morte, da dor de perder uma vida, mas que ela sempre vai valer a pena, é a da série A maldição da Residência Bly:

“Amar verdadeiramente outra pessoa é aceitar que o trabalho de amá-la vale a dor de perdê-la.”

Afinal, viver é isso. Vamos todos perder algo, alguém ou nós mesmos em algum momento, mas sempre vai valer a pena. Negar a dor, afastar conexões, se isolar, é viver pela metade.

Reprodução: A maldição da Mansão Bly (2020) (Divulgação)

Porém, caso exista algum milagre, é a nossa capacidade de amar, com todo nosso coração. Acho que essa é a única coisa que alivia o peso de morrer. Quando amamos, o mundo lá fora se torna mais tranquilo, o chão se torna mais firme. O amor não foge, não desaparece. Mesmo quando nossos corpos esfriarem ou virarem cinzas, o amor é uma tatuagem que deixamos em todos que amamos, e, como tudo pode se acabar pela manhã, o amor é no final tudo que importa, tudo que nos resta.

Como é dito em Maldição da Residência Hill:

Eu amei vocês por inteiro e vocês me amaram da mesma forma, isso é tudo. O resto é confete.
Reprodução: A Maldição da Residência Hill (2018)

O amor é a única resposta que sou capaz de encontrar nesse mundo louco e que nunca me entregou nenhum guia. É tudo que eu tenho de precioso e é tudo que permanecerá comigo.

Enfim, não é a primeira vez que escrevo sobre o tempo ou morte, mas é a primeira vez que olho pra ela dessa maneira crua, até um pouco visceral, de algo que arranca tudo e não entrega tão pouco.

Talvez por causa de escritores que entrei em contato, como Sylvia Plath. Em seus textos, ela me faz sentir a magnitude de tudo que eu poderia ser, das habilidade que eu poderia aprender, de toda arte que eu poderia digerir, mas que nunca terei tempo o bastante.

A carne que me encontrou irá falhar, e, quando isso ocorrer, meu espírito, alma ou seja lá o que nos torna quem somos, vai se desprender disso. Quando paramos para observar dessa forma, podemos perder o rumo, surtar ou apenas se sentir minúsculo, mas talvez isso também nos liberte de nunca nos sentirmos satisfeitos. Talvez se vivêssemos para sempre, ficássemos numa tentativa inútil de preencher um vazio constante pela eternidade e acabar ignorando todas as coisas que realmente importam.

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