JOICE: nome que exala força, assim como a mulher que vejo.

Natural da zona rural do distrito de Ipoema em Itabira/MG, essa mulher de 30 e poucos anos, consegue demonstrar coragem e disposição, mas ao mesmo tempo, timidez. Característica que faz parte de sua criação reclusa no interior, onde viveu boa parte de sua vida. É uma mulher bonita. Negra de cabelos lisos e pretos, usa também uma blusa preta durante nossa conversa. Preocupa-se  com ângulo para a foto, mesmo não sendo muito vaidosa pede:

“Escolha a melhor foto para o meu perfil.”

O cômodo em que está resume bem a principal mudança de sua vida durante a pandemia, o quarto de seu filho. Ao fundo do vídeo, os nichos na parede azul com bichinhos de pelúcia e cortinas combinando, demonstram o cuidado e o carinho em cada detalhe e como esse bebê foi desejado. Joice descobriu seu lado mais doce através da maternidade. Nunca imaginou que ouviria tanto Patati e Patatá e diversos outros artistas infantis, até não conseguir mais. Está sempre procurando novas atividades e brincadeiras, visando criar seu filho de forma mais livre e moderna:

Não quero que ele seja um homem machista e preconceituoso.

Miguel chegou em agosto de 2019, fazendo-a desvendar todos os  desafios que uma mãe de primeira viagem enfrenta. Mas o que ela nem poderia imaginar é que logo no início de 2020, além de lidar com as múltiplas tarefas e a jornada dupla, que como mulher ela enfrenta diariamente, ainda surgiria uma pandemia.

O fim de sua licença maternidade coincidiu com a chegada dos casos de Coronavírus no Brasil. O plano de deixar seu filho em uma escolinha para voltar ao trabalho foi por água abaixo ao se deparar com tudo fechado. Mas ao fim do túnel, surgiu uma luz: Era sua mãe. As mães sempre amparam as outras nesses momentos e aqui não foi diferente. Agostinha se dispôs a cuidar do seu neto por alguns meses e assim o fez. Foi quando sentiu enorme saudade de casa e do marido, dos bichos e das plantas que sempre cuidou com carinho que resolveu voltar. E sua filha se viu frente ao mesmo desafio novamente. Além de trabalhar, curtir o seu casamento e cuidar da casa, agora não havia ninguém para olhar o seu filho…

Como lidar com tudo isso em um momento tão estarrecedor?

Estava assustada e sem saber o que fazer. De alguma dessas coisas, precisou abrir mão para conseguir viver com mais calma. E sua escolha foi feita. Saiu do emprego no supermercado que trabalhou durante anos e então se viu desempregada em meio à pandemia. Nunca gostou muito desse trabalho, passou por situações difíceis e injustas. Mas precisava dele e lá permaneceu por longos 11 anos.

Ficou parada, até que uma amiga a indicou para um novo emprego. Trabalhou por um mês e sua irmã, que agora morava com ela em função da pandemia, ofereceu cuidado ao pequeno Miguel. Tudo parecia caminhar bem, mas ela não se adaptou a esse trabalho, depois de tantos anos desempenhando a mesma função no antigo. Decidiu sair, pois além de não ter se habituado a tanta cobrança de suas chefes sobre a sua imagem (roupas padronizadas, cabelos soltos e lisos, salto, maquiagem), clientes muitas vezes difíceis de lidar, sistemas complexos de mexer e um salário que não compensaria tamanho desgaste, sua irmã, que cuidava do Miguel, agora precisava estudar.

E novamente ela encarou a mesma situação…

Além de uma mulher forte como a vida a fez, ela sempre foi uma mulher independente. Teve o seu primeiro emprego com carteira assinada logo aos 18, mas começou a trabalhar mesmo bem antes disso, por volta dos 14, 15 anos de idade. O fato de não ter uma renda própria e deixar as contas para o marido a incomodava. E confessa:

Foi tenso, passamos alguns apertos, deixamos algumas contas atrasadas…

Mas sua voz não desanima, pois seu jeito nunca foi de desanimar. É o pau, é a pedra, mas não foi e nem haveria de ser o fim do caminho para ela.

Restabeleceu sua própria renda através da venda de queijos, vindos do sítio de seu pai. Um pouco envergonhada, relutou em contar a origem dessa grana extra que fez, mas aos poucos foi descrevendo como aquele dinheiro a ajudou. Afinal, um trabalho honesto para ela sempre foi motivo de orgulho independente de tudo.

Mais alguns meses se passaram e ela recebeu da vida o que tanto esperou, um emprego na área em que se formou em 2014. Hoje ela trabalha como auxiliar em Segurança do Trabalho e seu sobrinho que mora no mesmo condomínio cuida do amado Miguel.

Ao fundo de nossas conversas o seu pequeno filho faz barulho e ela se desdobra em duas ao prestar atenção nas coisas que ele faz, mas sem perder o rumo da conversa. Viver a maternidade real, é um eterno exercício de equilíbrio entre as várias facetas da mulher. O ato de maternar, exprime bem a dor e a delícia de ser o que é. É onde se descobre o extremo das emoções, é o que te faz querer se tornar uma pessoa melhor para aquela em que você tem de dar o exemplo. Em função deste ato, Joice muitas vezes esquecia-se de si mesma. Mas não se arrepende. Colocar o Miguel em primeiro lugar foi sua melhor escolha:

Só sendo mãe pra sentir o que eu sinto, é um amor tão grande que não consigo explicar. E ainda quero ter mais filhos.

 Em momentos de isolamento e distanciamento social, ficar sozinha era seu maior medo. Sempre gostou de companhia para tudo, um bom papo durante o almoço, ou até mesmo durante a novela que não vive sem. E quem pôde lhe oferecer a companhia mais genuína durante esse período, foi aquele que veio do seu próprio ventre. Mesmo sem saber falar, os grunhidos soltos pelo Miguel fizeram parte das melhores conversas que já teve.