É engraçado como as coisas mudam rápido demais, né? 

Pois bem, leitor, vou lhe contar minha história de pandemia. 

No dia 05 de Março de 2020, eu estava plena em minha vida em viçosa quando, de repente, o mundo inteiro adoeceu. Caos completo. Ninguém sabe direito o que está acontecendo, mas o ideal é se isolar em casa, comprar mil papéis higiênicos, fazer uma compra absurdamente grande e viver sem necessariamente VIVER, sem aproveitar o mundão que existe aí para nós todos (com cuidado, claro! Porque não está sendo fácil nem para o planeta Terra). 

Começamos a seguir as indicações do Ministério da Saúde, à espera ansiosa de novas atualizações e, logo, à espera passou a integrar o desejo de uma vacina. Não sou de ferro e, pra quem adora sair com os amigos em uma noite de sábado, estava sendo bem difícil voltar para Belo Horizonte e me manter em casa com meus pais novamente. Na metade do isolamento social, que teoricamente deveria ter durado duas semanas e virou quase dois anos, me arrisquei e decidi instalar um desses aplicativos de relacionamento online. Conheci um carinha, dois, uma moça, algumas pessoas interessantes e passei a conversar com o menino do gif de cachorro fofo. O gif de cachorro foi enviado em uma das nossas primeiras conversas. Fofo, mas clichê né ?! 

A questão é que este menino do gif se tornou importante pra mim de uma forma extremamente rápida. A sinceridade dele me fazia, cada vez mais, confiar e me aproximar da sua linha de existência. 

Resolvemos nos encontrar.

Eu tinha acabado de mandar uma mensagem avisando que estava saindo enquanto brigava sobre a hora de voltar para casa com minha mãe que estava sentada no banco da varanda da mata da casa de minha avó. Subi três lances de escada e uma rampa para acessar a garagem e abri o portão que dava pra rua. Entrei no carro e fui, ansiosa, ao encontro do cara que queria conhecer. Não pensei muito no que realmente iria acontecer naquele bar em uma terça comum. O básico acredito que eu já sabia. A aflição não era exatamente a vontade de saber o que ocorreria, mas sim a minha curiosidade em ver quem era o menino do gif… quem sabe um amigo ? 

No fim, foi o cláááássico primeiro encontro. 

Oi. Tudo bom. Vergonhinha aqui. Conversinha ali. 

Para uma garota que foge de clichês, eu estava vivendo um bem legal.  

Enfim, depois de alguns encontros e viagens pro interior com família (sem estar namorando oficialmente), o garoto se tornou meu refúgio, meu acalento, minha lealdade e meu compromisso. 

Loucura um namoro sendo iniciado no meio de um momento onde todos devem ficar afastados, quando não se pode tocar, beijar, abraçar e sentir o gostinho de um carinho que é dado com afeto. 

A vida a dois exige que você cuide, compartilhe, respeite e se comprometa. É claro, me refiro a um relacionamento baseado no amor, na vontade de ambos estarem juntos, o que certamente exige investimento, tempo e dedicação. Quem não gosta de receber um elogio, um carinho, um beijo inesperado, se sentir amado e valorizado? Infelizmente, a trend do momento no mundo jovem é querer receber, mas não querer oferecer todas essas ações de afeto. Talvez eu até tenha uma percepção diferente dessa geração em relação ao significado do amor.

Amor não é eterno, não são flores, perfumes, sonhos ou alegrias, e nem sempre é querer estar junto o tempo todo. Amor não é tão superficial como todas essas coisas. É um sentimento mais profundo que adentra e remexe com todos os sentimentos que um ser humano pode sentir. Mais do que isso, é o companheirismo e a responsabilidade de entender quem está ao seu lado. Amor é querer se mostrar da forma mais genuína possível, ter resiliência de enfrentar as não alegrias e ser sincera quando algo precisa ser conversado. Talvez o segredo seja os combinados que precisam ser seguidos.

Falando assim até pareço que estou casada há 30 anos com a mesma pessoa. Mas a questão é que eu sempre acreditei que todos nós temos faces que podemos mostrar às pessoas através dos espelhos imaginários da nossa vida. Os espelhos são usados para ver o rosto, e por uma fração de segundo, nos vemos como um objeto a ser olhado. Estes mesmos espelhos podem ser usados para que você enxergue cada versão de si mesmo. O que quero dizer é que existe uma versão de você no trabalho e como se mostra aos outros, uma versão na escola ou faculdade, outra com os familiares e às vezes o seu relacionamento também faz você se apresentar com mais uma, a quarta face. Mesmo que você não acredite, todos nós escolhemos (voluntariamente ou involuntariamente) qual espelho mostrar em cada momento de nossa vida. 

No fim, o amor é querer mostrar o espelho da alma pra alguém, com todas as faces e versões. Comparando à natureza, percebemos que um lago tranquilo não mostra sua profundeza e nem a luz projeta uma sombra com proporções perfeitas. Com o espelho da alma é diferente. Ele não dá margem para sombras e mistérios. O personagem que está mostrando a face, no controle da sua composição, é o que ele é. Querer mostrar este espelho para alguém é querer mostrar um espelho que não esconde meias-verdades. Este espelho assusta, não é fácil de ser olhado porque ele te mostra em uma versão sem recortes.  Só você sabe todos os sentimentos que perpassam a história de quem está ali refletido, mas pode se arriscar a deixar ser visto por um alguém especial. Quem se atreve a te olhar, atreve-se a te ler inteiro, com sentimentos, dores, alegrias e medos. Essa leitura é por conta própria e auto-risco. 

Por isso, para o garoto do gif de cachorro, eu deixo aqui o risco de me ler . 

E você, leitor, se arriscaria a ser lido?