Numa cidade litorânea como São Mateus, mesmo com a refrescante brisa que sopra amena do mar, dias ensolarados podem ser sufocantemente quentes. O último domingo foi um desses. Quando o Sol despontou, brilhante, o prenúncio era de praia: sem sequer uma nuvem no céu, o calor castigava aqueles que se aventuravam fora da proteção de suas seguras sombras frescas. Admito não ter reunido coragem suficiente para enfrentar aquela ofuscante luz do dia, fazendo mais uso, dentro de casa, das suaves brisas que invadiam meu quarto, agitando preguiçosamente as cortinas. Após um tempo, já no fim da tarde, lentamente o Sol se punha, transformando o céu, antes azul celeste, numa desordem de cores em disputa pelo crepúsculo: laranja, rosa e roxo formavam um espetáculo aos olhos de qualquer um que ousasse olhar para cima. Foi nesse momento que, como de costume, levei minha caixinha de som azul comigo para o banho. Coincidentemente, não demorou muito para que ela reproduzisse o novo álbum da Lorde, Solar Power – energia solar – em que ela, vestida de amarelo na capa, celebra a força e a energia do astro-rei. A letra da música citava os agitados dias de verão e praia conectando nossa vida ao brilho do Sol. Completamente imerso na melodia, eu pensei mais nessa conexão, percebendo o Sol em quase todos os cantos daquele banheiro, direta ou indiretamente. Reparei na água caindo, quente, do chuveiro, lembrando que as placas solares, estrategicamente posicionadas no telhado de casa, a haviam esquentado, de modo que agora também irradiava o calor do Sol – Solar Power. Movendo meus olhos, vi sobre a pia um vaso, seu belo arranjo de pequenas tulipas cor de rosa… Como aquela planta sobrevivia à base da mesma radiação solar que queimava minha pele em dias ensolarados como aquele? Como a cor de suas pétalas poderia vir de um espectro luminoso mais amplo, presente na luz branca do Sol absorvida por suas folhas e transformada em energia para suas células? (só mais tarde que, analisando melhor, reparei que as flores eram de plástico) – Solar Power – o poder solar. De repente, o deslumbre: vejo pela janela do banheiro o nascer da lua azul (a segunda lua cheia do mês), redonda e brilhante, refletindo em sua superfície repleta de crateras a luz do Sol – Solar Power – que a esta altura já havia se posto. Contraste clareando a escuridão noturna salpicada por estrelas que o céu havia se tornado. Foi ali, admirando aquela Lua, que entendi a mensagem de Lorde: estamos todos conectados. Mesmo o Sol tendo se posto, ainda via sua luz refletida na Lua e sentia seu calor emanando da água, o que me fez ir além nas divagações. Lembrei de ter lido num dia, em alguma revista, algo sobre como os raios ultravioletas do Sol podem afetar nosso organismo, modificando, pela radiação solar – Solar Power – a expressão de genes e a reprodução de células, o que poderia explicar, por exemplo, o envelhecimento. Onde quero chegar com isso é que, independente de quem você seja, ou do lugar onde você mora, ou do que você faz da vida, todos temos uma parcela do todo dentro de nós, carregamos, cada um, a impressão do Sol em nossos organismos, a marca da vida e da criação divina, o aviso constante àqueles com olhar sensível e suficientemente atento aos sistemas em vigor à sua volta de que o macro está, a todo tempo, conectado ao nosso microcosmos. É somente refletindo-se sobre as partes de si no outro (e vice-versa) que podemos compreender como o universo está em profunda sintonia conosco. O que diferencia um planeta orbitando um astro de um elétron orbitando um próton, é apenas a escala.