A luta do Sistema Único de Saúde no país
A grande reportagem multimídia escolhida foi produzida pela equipe do Nexo Jornal, em abril de 2020, primeiros meses da explosão da pandemia do Covid-19 no Brasil e no mundo. Logo, viu-se a necessidade em abordar um tema extremamente importante e cujas complexidades históricas não são retratadas e discutidas diariamente: os desafios da criação e manutenção do Sistema Único de Saúde do país.
Com uma equipe composta por Sariana Fernández, na Arte, Gabriel Zanlorenssi, Gabriel Maia e Lucas Gomes na coleta e revisão de dados e gráficos, Emilio Haro e Jessica Oliveira, responsáveis pelo desenvolvimento da produção, Conrado Corsalette e José Orenstein na edição, e por fim, Maia Gonçalves Fortes à frente da edição, foi produzido a grande reportagem “O que é, de onde veio e para onde vai o SUS”.
Adotando uma narrativa construída tendo como base uma “linha do tempo”, percebemos a sua excelente utilização desde o título da reportagem até as ferramentas multimídias apresentadas ao longo de todo o conteúdo proposto. O texto por si só já se compreende como uma grande reportagem de excelente envolvimento com o leitor e de alta importância social no contexto em que vivenciamos. A decisão pela linguagem multimídia para essa reportagem foi precisa e garantiu que o resultado fosse mais completo e mais assertivo.
A reportagem pode ser lida em uma suposta divisão composta por quatro momentos. Logo de início somos apresentados a uma breve introdução, como uma espécie de lead, abordando a criação e as conquistas do SUS e o contexto do país constitucionalmente. A seguir, a seção “Para entender o SUS”, utiliza de recursos de boxes interativos para explicar os princípios do sistema de saúde, a organização deste e o papel de cada esfera do governo (União, Estados e Distrito Federal e Municípios) na responsabilidade pela saúde dos brasileiros.
A terceira parte é um rápido bloco do “SUS em números”, expondo e explicando os gastos do sistema, os valores em dinheiro aplicados, o número de hospitais públicos no país, o número de hospitais privados com vínculo ao sistema público, a quantidade de leitos disponíveis e aqueles que foram inativados. Por meio destas informações, conseguimos interpretar de maneira clara, por mais que indireta, os acertos e erros do sistema ao longo dos últimos anos.
A última parte, mais completa e onde passamos a realmente consumir o conteúdo preparado, é a linha do tempo, que percorre de 1923 a 2020. O recurso de tempo é dividido em dois momentos: “A saúde antes do SUS” e “A criação e os desafios do SUS”, abrangendo inclusive as expectativas do sistema frente à realidade brasileira. Assim, o leitor é orientado a visualizar o conteúdo de forma lúdica e eficiente pelo caminho que o SUS percorreu até chegar aos dias de hoje.
As imagens utilizadas pintam perfeitamente os múltiplos cenários do país de acordo com a época e ações realizadas, capturando momentos-chave da saúde brasileira, tornando a narrativa muito mais real e emocionante. Da mesma forma, somos apresentados a arquivos de áudio de inúmeros depoimentos que dão vida e “voz” aos cenários, sendo importantíssimos e fundamentais para a ambientação da reportagem e tornando todo o enredo mais pessoal.
Temos falas de José Carvalho de Noronha, doutor em saúde coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz; José Gomes Temporão, doutor em saúde coletiva e ex-ministro da Saúde entre 2007 e 2011 (Governo Lula – PT); Vera Shatan, cientista social especialista em políticas públicas e análise política e pesquisadora do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento); Paulo Dantas, ex-secretário municipal de saúde do Recife e primeiro presidente do Conasems (Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde); Ligia Giavonella, professora do Programa de Pós-graduação em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz; Rudi Rocha, doutor em economia e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas).
Captura de tela de dois depoimentos presentes na reportagem Captura de tela de blocos interativos
Todos esses áudios são passíveis de serem “pausados” e escutados a qualquer momento, concedendo total autonomia ao leitor de como irá consumir aquele conteúdo disponibilizado. O mesmo acontece com os depoimentos em textos do já mencionado José Carvalho de Noronha, Lucia Souto, presidente do Cebes (Centro Brasileiro de Estudos da Saúde), e de José da Rocha Carvalheiro, professor aposentado da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP e ex-presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva). O leitor pode optar por “expandir” ou “recuar” os depoimentos, lendo-os ou não.
Os gráficos numéricos, como por exemplo da “expectativa de vida ao nascer” e da “mortalidade infantil”, apresentados na primeira seção da reportagem, podem ser recuados e expandidos da mesma forma que os depoimentos. Por serem arquivos relativamente grandes e utilizados como um facilitador da informação, o leitor possui total liberdade em escolher analisá-los ou não.
Ao escolher um exemplo de grande reportagem multimídia, não restou dúvidas de que a reportagem do Nexo seria uma excelente seleção. De uma produção impecável, “O que é, de onde veio e para onde vai o SUS”, se utiliza de maneira elogiável de diversos recursos midiáticos para construir um trabalho coeso e completo. Nesta reportagem, os recursos não são utilizados como “muletas” para preencher um texto insatisfatório mas sim, para enriquecer e dinamizar uma já excelente narrativa.
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As fontes selecionadas vão além de documentos históricos, o leitor pode interagir com personagens vivos que foram protagonistas na história do Sistema Único de Saúde. A grande reportagem escolhida vai muito além de um relato sobre a construção de um sistema de saúde, ela aproxima o leitor de cada passo descrito e nos força a lembrar: O brasileiro precisa do SUS, o brasileiro vive o SUS.
Análise realizada por Jéssica Morgenia e Letícia Passos.