NÚMERO DE DOCENTES COM ENSINO SUPERIOR AUMENTA NO BRASIL
Dados divulgados pelo INEP mostram alta substancial do número de professores com graduação e pós-graduação nos últimos 9 anos.
Os números do Censo Escolar da Educação Básica de 2020 mostram um crescimento considerável na taxa de docentes com graduação e pós-graduação lecionando nas escolas brasileiras. Esse dado positivo está previsto nas metas do Plano Nacional de Educação – PNE, aprovado e sancionado em 2014. Nos últimos 7 anos, o percentual saltou de 30,2% para 43,4%, um aumento de quase 45% no número. O Censo é coordenado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP e realizado em regime de colaboração entre as secretarias estaduais e municipais de educação e com a participação de todas as escolas públicas e privadas do país. Ele é o principal instrumento de coleta de informações da educação básica e a mais importante pesquisa estatística educacional brasileira.
Rogério Correia, Deputado Federal (PT/MG) e membro da Comissão de Educação da Câmara, explica que os números do Censo aferem o nível de empenho do país na melhoria da qualidade da educação. Segundo ele, “a docência necessita de uma formação em nível superior dada a complexidade do exercício da profissão” e, por isso, essa meta é um parâmetro internacional de avaliação qualitativa da área. “O ensino básico, como o próprio nome diz, assegura conhecimentos básicos que são elementares para o exercício da cidadania. O ensino superior é profissionalizante. Ele é mais específico, traz mais elementos e aprofunda mais as temáticas de cada profissão, incluindo a docência” e, por isso, traz melhores condições de formação aos educadores.
O professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal de Viçosa Fernando Conde atribui esse crescimento ao REUNI, Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais, que aumentou o quantitativo de docentes nas instituições federais de ensino. Mas principalmente à expansão do ensino superior nas instituições privadas e de programas governamentais como FIES (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior) e PROUNI (Programa Universidade para Todos). Sobre este assunto, o professor ressalta que “a expansão tanto do público como do privado gerou um aumento do número de estudantes, o que, por sua vez, gerou um aumento do número de professores”.
Em todos os cenários, os números do ensino público se mostram superiores aos da educação privada. Susana Lúcia do Nascimento, da Superintendência Regional de Ensino de Ponte Nova, pontua que isso se deve muito ao número de concursos públicos realizados, tanto na rede municipal quanto na estadual, que exigem essa habilitação dos profissionais.
Além disso, Susana Lúcia afirma que a legislação não determina as mesmas regras para as duas instâncias. Na rede pública, existe a Titulação, um benefício assegurado por lei que o docente concursado recebe à medida que dá continuidade a sua formação. Também, Fernando Conde explica que esse valor pode corresponder a até 50% do salário, o que incentiva os profissionais a se especializarem cada vez mais.
A rede privada, além de não garantir esse benefício, trabalha com profissionais com autorização para lecionar no lugar da titulação. Ou seja, um maior nível de formação não implica um aumento de salário e, muitas vezes, não é vantajoso para docentes que já têm muitos anos de experiência em sala de aula ou que estejam próximos de se aposentar, por exemplo.
O CASO DE VIÇOSA
De acordo com informações disponibilizadas pelo INEP, foi verificada uma mudança na taxa de professores com ensino superior entre os anos de 2011 e 2020, em escala nacional e em Viçosa. Em seguida, a partir dessas informações, foi possível realizar uma comparação entre estas duas instâncias. Os últimos dados disponibilizados pelo Instituto são referentes ao ano de 2020, logo antes do decreto da pandemia do novo coronavírus pela Organização Mundial da Saúde – OMS
Em 2011, a porcentagem de docentes com ensino superior na Educação Infantil em uma escala nacional era de 53,6%, taxa que abrange tanto escolas públicas quanto privadas. Em 9 anos esse número cresceu 26%, chegando aos 79,3% . Viçosa apresentou dados superiores à média do país, tanto em 2011, quanto em 2020, tendo 64,9% dos professores da educação infantil com diploma superior em 2011 e chegando a 82,9% em 2020, mostrando um crescimento de 18%.
Em relação ao Ensino Fundamental, as taxas cresceram substancialmente. Em 2011, no Brasil, a porcentagem era de 75,3%, chegando a 89,5% em 2020, uma alta de 14,2%. Já em Viçosa, os números surpreendem mais uma vez, sendo 92,7% já em 2011 e crescendo até 95,8% em 9 anos, aumentando a porcentagem total em 3,1%.
Por fim, analisando os dados do Ensino Médio, é possível perceber que os números nacionais têm uma alta considerável, enquanto os de Viçosa se mantêm estáveis, quando comparados aos números do Ensino Fundamental. Os dados do Brasil em 2011 eram de 92,7%, alcançando 97,3% em 2020. Já os dados de Viçosa eram de 94,5% em 2011, chegando a 95,3% em 2020. É possível notar que essa é a primeira vez que a média municipal é menor que a média nacional.
Após essa verificação ao longo dos anos, a reportagem comparou também a situação da capacitação dos professores viçosenses, em relação à capacitação dos professores da capital do estado, Belo Horizonte, para verificar se os dados mais se assemelham ou se distanciam.
No ano de 2020, a porcentagem de educadores da Educação Infantil com curso superior foi maior na cidade de Viçosa. Enquanto Belo Horizonte apresentou uma fração de 68,8%, a cidade do interior ultrapassou essa quantidade, com um resultado de 82,8%. Nas instâncias pública e privada, Viçosa também apresentou dados superiores aos da capital.
No Ensino Médio, Belo Horizonte superou os índices de Viçosa em 0,01%: na capital mineira, a porcentagem total entre docentes formados em cursos superiores foi de 95,9%, enquanto Viçosa apresentou 95,8%. Quando comparadas as informações sobre a rede pública, os dados também se mostram próximos, uma vez que Belo Horizonte tem 99,3% desses professores com curso superior e Viçosa, 99,5%, ultrapassando por pouco a porcentagem da capital. Já no ensino público, Belo Horizonte mostra 89,7% de docentes formados, enquanto Viçosa apresenta 87,3%.
As comparações entre os dados do Ensino Médio apresentaram resultados um pouco mais contrastantes em relação à rede privada: a capital mineira mostrou 96,2% de professores com curso superior. Já a cidade do interior, teve uma porcentagem de 89,1%. No ensino público, os percentuais não apresentaram diferenças muito significativas. Belo Horizonte e Viçosa indicaram, respectivamente, 98,7% e 99,4% de docentes formados. No total de servidores ativos no Ensino Médio, apenas 4,7% de professores viçosenses e 2,2% de docentes belorizontinos não possuem curso superior.
PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO – PNE
A principal estratégia para desenvolver a educação em âmbito federal é o Plano Nacional de Educação, ou PNE. A primeira edição do documento surgiu em 1962 e, desde então, é periodicamente revisada e acrescida de novas propostas. Em síntese, o Plano tem como objetivos a elevação global do nível de escolaridade da população; a melhoria da qualidade do ensino em todos os níveis; a redução das desigualdades sociais e regionais no tocante ao acesso e à permanência, com sucesso, na educação pública; e a democratização da gestão do ensino público, nos estabelecimentos oficiais, obedecendo aos princípios da participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola e a participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
O PNE vigente é o de 2014 e tem validade de dez anos. Até 2024, escolas, institutos e instituições públicas, privadas e filantrópicas de ensino devem trabalhar para cumprir as metas estabelecidas por especialistas, votadas pelo Congresso Nacional e sancionadas pela ex-presidente Dilma Rousseff. O atual plano, entretanto, é bastante semelhante ao plano anterior (PNE/2001-2010) e boa parte das metas direcionadas ao Ensino Básico e Superior foram reaproveitadas dado o não cumprimento delas até o prazo determinado. O Deputado Rogério Correia, alerta que em nenhuma das etapas da educação básica o avanço no percentual de docentes com formação adequada tem sido rápida o suficiente para que se atinja até 2024 o nível estipulado no Plano Nacional de Educação e que isso é “preocupante”, diz.
As metas 15 e 16, que definem, respectivamente, uma política nacional de formação específica dos profissionais da educação em curso de licenciatura na área de conhecimento em que atuam e uma de formação em nível de pós-graduação de 50% dos professores da educação básica, ainda não foram cumpridas. Segundo o último relatório do INEP, faltando pouco mais de 3 anos para o vencimento do atual PNE, a primeira atingiu 50,6% de sucesso e a segunda apenas 30,2%. Rogério destaca que é natural que as metas ainda não estejam totalmente cumpridas: “quando você coloca uma meta e um prazo, você dá abertura para que os estados e municípios se organizem dentro das suas possibilidades e de acordo com essas diferenças econômicas e estruturais de cada um. O PNE leva em conta que essas metas podem não ser cumpridas ao mesmo tempo, mas que elas certamente serão cumpridas até o fim do prazo”, diz.
Entretanto, é preciso estar atento. Segundo o deputado, o problema não é o Plano Nacional de Educação, mas sim as tentativas de desmontá-lo. “O que temos visto são políticas discriminatórias, excludentes, de censura e esvaziamento da escola como um lugar vivo, democrático, transformador, livre e plural”, diz. Rogério também afirma que “além de não estar sendo cumprido hoje, o PNE tem sido substituído por ações e políticas públicas que vão na contramão do que ele preconiza”, como o Novo Ensino Médio.
O NOVO ENSINO MÉDIO
Em 2017, foi validada a lei 13.415/2017, antes chamada de Medida Provisória 748/2016 e sancionada pelo então presidente Michel Temer, criada com o objetivo de reestruturar o Ensino Médio nas escolas brasileiras, a partir da proposta de uma educação de qualidade, ao compasso das novas demandas e complexidades dos âmbitos estudantil e profissional. Dentre as mudanças propostas, estão a reformulação da base curricular e o aumento da carga horária estudantil, de 800 horas/ano para 1000 horas/ano. Além disso, a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) contemplará as disciplinas obrigatórias, que apresentam conteúdos essenciais aos alunos.
Contudo, mesmo com a Base Comum, os estudantes poderão escolher, a partir de suas afinidades, as outras disciplinas que irão cursar, dispostas pelos Itinerários Informativos. Nesse modelo, estão inseridos projetos, matérias e oficinas voltados para o aprofundamento em determinada área de conhecimento ou na Formação Técnica e Profissional (FTP).
Em relação aos professores, para que possam ministrar as disciplinas da educação básica, estes terão que apresentar formação em nível superior em curso de licenciatura. Caso apresentem complementação pedagógica, os docentes graduados também poderão atuar na educação básica. No caso da FTP, profissionais com “notório conhecimento” poderão, também, dar aulas, desde que em áreas de sua formação profissional.
Mesmo com a intenção de aprimorar a educação brasileira, o Novo Ensino Médio mostra algumas dificuldades, tais como a capacitação dos docentes para lecionarem disciplinas com conteúdos aprofundados. Sobre isso, Fernando Conde ressalta: “Sobretudo, do ponto de vista do professor, da professora, eu vou ter que me capacitar para conseguir dar aula disso [outras disciplinas da mesma área de conhecimento], ficar estudando em casa. E quem paga isso? Ninguém. Isso é responsabilidade do próprio professor.”
Além dessa circunstância, existe ainda o entrave da formação dos professores por parte das universidades. Uma vez que é necessário que os docentes tenham diploma de curso superior, é preciso que as instituições os capacitem para essa nova realidade escolar, bem como ressalta Susana Lúcia: “A formação hoje das universidades, em licenciaturas, não dá essa base para os profissionais. Porém, a formação por área como o novo Ensino Médio aponta não é feita especificamente pelas universidades. Para obter essa formação específica, as universidades têm que reformular os seus currículos e começar a fazer a oferta de formação por área de conhecimento.”, diz a especialista.
Por fim, Rogério Correia afirma que é preciso avançar no processo de melhoria da educação e que “não há dúvidas de que esse avanço só se tornará possível e concreto a partir do momento em que nós tivermos a aplicação das metas do PNE e o necessário aporte de recursos para viabilizar as estratégias previstas para alcançar cada uma delas”, o que, segundo ele, não tem acontecido.
Fontes: INEP, Ministério da Educação, Brasil Escola,