Análise: Reportagem Multimídia “Te Dou Uns Dados”

Análise: Reportagem Multimídia “Te Dou Uns Dados”

Este texto propõe-se a apresentar uma análise descritiva da reportagem multimídia “Te Dou Uns Dados”, da UOL TAB, plataforma online da empresa UOL destinada à publicação de conteúdo jornalístico multimídia. Como referência, serão tomadas as discussões e explicações colocadas em aula da disciplina de Laboratório de Jornalismo Online, ministrada pelo Prof. Henrique Mazetti, além do artigo “O turning point da grande reportagem multimídia”, de Raquel Longhi (2015).

A reportagem foi publicada em 21 de outubro de 2019 e tem a arte de Alex Kidd, edição de Olívia Fraga e Rodrigo Bertolotto, reportagem de Jacqueline Lafloufa e vídeos de Mariah Kay. Classificada pelo próprio site como um “especial”, ela trata de como o mundo digital parece se configurar de uma maneira nociva à privacidade. Recorrendo a falas de especialistas de múltiplas áreas do conhecimento, como a Comunicação, a Sociologia, a Antropologia, o Direito e a Psicologia, a matéria argumenta que trocar informações pessoais por benefícios e comodidades na Internet, como serviços gratuitos e descontos, pode não ser uma boa ideia.

O tom argumentativo do texto manifesta a característica interpretativa desse gênero jornalístico, herança, talvez, do jornalismo literário. Conforme vai apresentando as informações, a repórter deixa marcas de suas impressões pessoais frente a elas, por vezes valendo-se de perguntas para expressar seu raciocínio. É o caso, por exemplo de “Parece mais provável que tenhamos colocado a privacidade em uma UTI”, “Se máquinas sabem mais sobre nós que nossos familiares e amigos, elas podem nos influenciar muito mais (…)” e ainda “Será que vale mesmo a pena trocar a sua privacidade por um punhado de curtidas ou um pequeno desconto? A escolha é sua, apesar de esta ser cada vez mais influenciada pelas máquinas (…)”.

A repórter deixa marcas de suas impressões pessoais
A repórter deixa marcas de suas impressões pessoais

Contando com cerca de 2000 palavras, uma extensão um tanto pequena para o gênero, o texto é distribuído verticalmente, alternado com elementos multimídia, como vídeos e colagens ilustrativas, os quais trazem uma estética que remete ao universo da espionagem e da vigilância. Câmeras, olhos, telas e códigos são exemplos de elementos visuais utilizados na reportagem para traduzir simbolicamente tais noções.

Vídeos remetem ao universo da espionagem e da vigilância
Vídeos remetem ao universo da espionagem e da vigilância

Os infográficos, por sua vez, desempenham um importante papel na transmissão das informações de forma clara, objetiva e, ao mesmo tempo, atrativa. Três deles estão presentes: o primeiro, mais extenso, trata do edifício panóptico como síntese da ideia de vigilância, com desenhos, esquemas, fotografias e comentários em texto; o segundo indica quais informações do usuário o smartphone é capaz de coletar; o terceiro apresenta um esquema e explicações a respeito das três esferas de dados pessoais. O fato de aparecerem intercalados ao texto, enriquecendo a reportagem com novas informações e explicações, aponta para a coordenação desses elementos multimídia na reportagem analisada, em oposição ao que se poderia chamar de uma multimidialidade redundante.

Verifica-se que os elementos multimídia ocupam toda a extensão horizontal da página, ocupando inteiramente a tela conforme o usuário utiliza o “scrolling”. No vídeo apresentado no topo, junto ao título da reportagem, é possível observar inclusive a aplicação do “paralax scrolling”, recurso em que o elemento ao fundo – no caso, o vídeo -, rola em uma velocidade menor que o conteúdo principal – ou permanece estático – enquanto o usuário desce e sobe a página, o que proporciona uma sensação de profundidade.

“Paralax scrolling” no topo da página

Vale destacar, enfim, que a disposição do conteúdo nos moldes acima descritos é muito típica da terceira fase da grande reportagem multimídia segundo Longhi, tendo sido proporcionada pelos avanços tecnológicos recentes, sobretudo o surgimento do HTML5 a partir de 2011. Especificamente, a verticalização do conteúdo possibilita uma experiência narrativa multilinear, à medida que o usuário pode, a todo momento, deslocar-se para qualquer ponto da matéria, utilizando a barra de rolagem. Trata-se, também, de uma estrutura muito adaptável aos dispositivos móveis. No caso analisado, a versão da reportagem para celular traz até mesmo os infográficos adaptados à visualização em telas verticais, exemplo de preocupação do veículo jornalístico com a responsividade.

Marco Túlio de Miranda

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