Menos diplomas do que vagas

A Universidade Federal de Viçosa tem, cada vez mais, formado menos

Inaugurada em 1926, a Universidade Federal de Viçosa tem uma história extensa de excelência no que diz respeito a ensino, tecnologia e extensão, com bons reconhecimentos nacionais e internacionais em cursos dos seus três campi: Viçosa, Florestal e Rio Paranaíba. 

Eleita entre as quatro Universidades Federais brasileiras que obtiveram na avaliação do MEC o conceito avaliativo 5, nota máxima na avaliação do Ministério da Educação. Destaque como a 2° melhor universidade do estado de Minas Gerais, e a 13° de todas as instituições de ensino superior do país, dentre públicas e privadas no levantamento da Academic Ranking of World Universities (ARWU), conhecido popularmente como ranking Xangai. A avaliação incluiu mais de  2.500 instituições de ensino superior e, apenas 18 das colocadas são brasileiras, e todas públicas. Devido ao seu histórico forte nas áreas de ciências agrárias, a UFV também teve destaque global nas avaliações acadêmicas Agricultural Sciences, onde ficou em 151° lugar dentre 200 avaliados; e Food Science & Technology, onde se  qualificou no 201° lugar, de 300 colocados. 

Contudo, mesmo com tamanha qualidade e reconhecimento, a UFV – assim como outras universidades públicas brasileiras – enfrenta desafios crescentes relacionados à entrada, permanência e conclusão de seus estudantes.

Um problema nacional

De acordo com o Censo da Educação do Ensino Superior do ano de 2022, houve uma queda abrupta nas matrículas em universidades federais que não era vista desde 1990. No período entre 2019 e 2020, o número de estudantes interessados em ingressar no ensino superior pelas UFs passou de 1,3 milhões para 1,2 milhões. Além disso, segundo dados divulgados pelo jornal O Globo, quase 300  mil estudantes decidiram suspender a graduação no período da pesquisa. 

Esse é somente o primeiro dos problemas que vem aumentando cada vez mais e para a Federal Mineira isso representou um déficit em 13% das vagas nos últimos três anos. Ao todo a Universidade Federal de Viçosa oferece 3.275 vagas em 67 cursos diferentes, somados todos os campis, mas somente nos últimos dois anos foram 859 vagas ociosas.


A evasão e a retenção

O desinteresse pelo ingresso na universidade já explicaria parte da razão da conta entre vagas X diplomas não fechar. Porém, esse não é nem de perto o único dos motivos, a evasão e a retenção que os cursos tem enfrentado tem sido o principal causador da problemática. 

Antes de olharmos para os dados, vale entendermos:

  • Conclusão: consideram se os alunos que concluíram a graduação dentro do previsto pela universidade para aquele curso;
  • Evasão: refere-se aos alunos que saíram da universidade sem a conclusão do curso e sem formalizar transferência para outra universidade;
  • Retenção: a permanência prolongada do estudante universitário na instituição que ultrapassa o período regular de integralização do curso;

A partir desse argumento, podemos notar que de 2000 até 2010 a UFV contava com cerca de 64,2% alunos concluídos e 35,8% de evasão, quando olhamos de 2011 até 2019, antes ainda da pandemia, a evasão já era de 52.3%

Distribuição percentual de conclusão e evasão de estudantes ingressantes por modalidade de cota.

Distribuição percentual da situação acadêmica dos estudantes por modalidade (AC e Cota), destacando os índices de conclusão, evasão, matrícula e retenção.

É possível vermos também, a partir de 2015, os dados de retenção. Por serem anos mais recentes, ainda existem alunos que estão ativos na universidade durante esses 10 anos, para isso muitos realizam o ENEM novamente, renovando o período limite, mas permanecendo com a mesma matricula. 

Números que preocupam:

Para deixar mais claro um dos casos gritantes que a universidade enfrenta hoje em dia, vamos entender um caso em específico. Neste caso olhamos para o departamento de física, isso porque ele enfrenta passa por todas as dificuldades previstas anteriormente. 

Dentre toda a abrangência da universidade, selecionamos os dados relacionados ao campi de Viçosa para serem aprofundados aqui, devido a obter a maior abrangência física, de matrículas, mas principalmente pelo acesso aos dados.  

Em conjunto o departamento escolhido,  estão as licenciaturas em Química, Matemática e Biologia, no entanto, esse se destacou, pois é possível encontrar a licenciatura em Física como 1º lugar em pior taxa de sucesso da graduação e o bacharel em física como 4°. 

A licenciatura lida 92.5% de taxa de evasão entre os anos de 2010 e 2018, assim sendo o curso com menor taxa de sucesso de toda a universidade, ou seja, a relação entre o número total de formados para o de ingressantes é de 7,4% desde 2006.

Já o bacharel em física ocupa o 4º lugar nas piores taxas de sucesso. Esse, por sua vez, além da taxa de evasão de 77.8% ainda vem tendo déficit no ingresso, nos anos de 2023 e 2024 foram 17 vagas em aberto das 70 que são ofertadas.

Se a crise é tão grande, como é ser graduando de Física na UFV – Viçosa?

Sarah, de 23 anos, estudante de Física Bacharelado desde 2020, compartilhou as dificuldades enfrentadas ao longo da graduação. Com seis reprovações, principalmente no ciclo básico, ela confessou já ter pensado em abandonar o curso, motivada tanto pelo desempenho acadêmico quanto pela desistência de colegas. “Sinto muita dificuldade em ver os meus amigos se mantendo no curso, visto que a maioria dos que entraram comigo acabou desistindo, e são pouquíssimos os que sobraram”, relatou. Apesar dos desafios, Sarah continua no curso mas acredita que apenas uma pequena parcela dos colegas conseguirá concluir a graduação.

Ela é ex-presidente do Centro Acadêmico de Física (CAFIS), teve papel fundamental em um momento crítico do curso. Durante sua gestão, no início de 2024, o departamento de Física recebeu uma notificação alertando sobre a alta evasão, especialmente no curso de Licenciatura. Sarah liderou reuniões entre estudantes e o departamento para discutir propostas que melhorassem a situação.

Entre os principais fatores apontados pelos alunos como motivadores da evasão estavam as dificuldades com a transição do ensino médio para a universidade, especialmente na área de exatas. “A grande maioria dos alunos chega com um ensino médio precário, principalmente em Física, e se depara com uma realidade muito diferente na universidade. Sem a base necessária, é difícil acompanhar o curso”, explicou.

Outro ponto levantado foi a abordagem das disciplinas do ciclo básico, com uma alta taxa de reprovação. Segundo Sarah, o departamento muitas vezes não considera as diferentes formações dos estudantes, apresentando os conteúdos de forma superficial e cobrando mais do que seria razoável. “Isso prejudica principalmente os alunos que não têm uma base sólida, tornando a reprovação frequente e desmotivadora”, destacou.

Além disso, Sarah mencionou o isolamento enfrentado por muitos estudantes, dado o número reduzido de colegas no curso. “Sem apoio, seja para estudar ou para se manter na universidade, muitos acabam desistindo”, afirmou. Apesar das dificuldades e até mesmo de momentos em que pensou em desistir, Sarah permanece no curso e segue engajada em melhorar as condições para os futuros estudantes de Física.

Desigualdade no incentivo entre bacharelado e licenciatura em Física  e as propostas para combater a evasão

Sarah ainda destacou um dos pontos mais sensíveis discutidos na segunda reunião sobre evasão no curso: a discrepância no apoio oferecido aos alunos do bacharelado em relação aos da licenciatura. Desde 2013, a licenciatura em Física apresenta o pior índice de sucesso acadêmico, enquanto o bacharelado ocupa a quarta posição. Durante o encontro, os alunos apontaram que o departamento incentivava mais a permanência dos estudantes do bacharelado, especialmente por meio de projetos de iniciação científica (PIBIC), enquanto iniciativas voltadas à docência, como o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), recebiam menos atenção e divulgação.

“Recebíamos muitos e-mails e convites dos professores para participar de projetos de iniciação científica, mas o mesmo não acontecia para iniciativas voltadas à licenciatura”, explicou Sarah. Essa diferença gerava desmotivação nos licenciandos, que tinham dificuldade em vislumbrar um futuro profissional claro, ao contrário dos bacharéis, frequentemente engajados em pesquisas e com maior acesso a bolsas de permanência.

Diante dessas críticas, o departamento propôs medidas para equilibrar o incentivo entre as duas modalidades. Entre as iniciativas discutidas, destacou-se a ampliação da divulgação do PIBID, a criação de projetos de extensão voltados ao ensino de Física em escolas de ensino médio e fundamental, e a possibilidade de vincular bolsas de iniciação científica a estudos relacionados à docência. “Uma das professoras sugeriu abrir um projeto de extensão para auxiliar escolas da região, voltado exclusivamente para licenciandos, com ou sem bolsas de permanência”, revelou Sarah.

Essas ações visam não apenas incentivar os estudantes da licenciatura a explorarem o mercado de trabalho na área educacional, mas também oferecer maior suporte financeiro e acadêmico para garantir sua permanência no curso, combatendo a evasão e promovendo um ambiente mais equitativo dentro da graduação em Física.

 Pelos dados, quanto tempo você ainda tem para formar?

Quando se passa no vestibular, com a aprovação vem um número, ele deveria dizer em quanto tempo você poderá voltar para casa, ou enquanto tempo pegará seu diploma com o carimbo da federação. No entanto, esse número tem sido uma teoria muito mais do que uma promessa, acontece que, na prática existem algumas outras perguntas a serem feitas para essa conta fechar, como, por exemplo:

Quantas vezes você fez calculo 2? Física 3? E fitopatologia?

Para alguns pode não significar nada, mas para outros, significam 1 ano e meio da vida universitária se repetindo até conseguirem ver o tão sonhado 61 no Sapiens. Além disso, é importante pensarmos quantos precisam trabalhar e enfrentam uma dupla jornada, ou aqueles que acabam tendo que voltar para casa por motivos familiares. Afinal, se você já se perguntou sobre a diversidade de regionalidades que Viçosa recebe, ficam aqui as 10 rotas mais traçadas pelos que foram admitidos entre 2010 a 2021: 

Estados com maior número de alunos enviados para a UFV – campus Viçosa, considerando graduação e pós-graduação entre 2010 e 2021.

Feitas todas essas perguntas, entendemos que fica difícil considerarmos somente 5 anos para as engenharias se o cálculo vai até o 3, a distância pra casa chega até mais de mil quilômetros e podem ocorrer pandemias, greves e muito mais. 

Assim vejamos a média por formação geral:

Evolução do número de concluintes e do tempo médio de conclusão dos cursos ao longo dos anos (2016-2024).

E finalmente, depois de entender os inúmeros motivos que implicam causam uma demora na conquista do diploma, e compreendendo um pouco mais do cenário de evasão e reprovações, vejamos a relação vagas x diplomas na Universidade Federal de Viçosa- campus Viçosa nos últimos 10 anos (2014 – 2024):

Evolução do número de diplomados em comparação com as vagas ofertadas entre 2014 e 2024.

Giovana Barbieri – 105742 – Isadora Campos – 105758, Luara Miranda – 105732 e Mariana Jovita – 105750

com365

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