Agricultura familiar: desafios e tradição
O dia a dia daquele que tira seu sustento da terra
Sempre com um sorriso no rosto, Dona Noemy, 57 anos, diz ser agradecida a Deus pelo que tem. Feirante há 10 anos e moradora da Paula, zona rural de Viçosa, seu foco é a produção de frutas – especialmente goiaba, manga e banana.
Mantendo uma relação de troca com a terra, ela e o marido plantam sem o uso de agrotóxicos e pesticidas no intuito de não prejudicar o solo, fazem compostagem mineral e orgânica, e uma pausa a cada sete anos. Quando perguntada se exerceria outra atividade, ela nega:
“Já trabalhei com um monte de coisa e não quis [continuar], eu gosto é disso, essa é minha paixão”.
Feira livre de sábado
Um dos maiores desafios para Dona Noemy como pequena produtora, é a desvalorização dos produtos pela atuação dos atravessadores, que revendem insumos para mercados e hortifrutis. Ela também participou do PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar), porém isto se mostrou outra dificuldade, visto que o custo para transportar suas mercadorias era maior que o lucro.
Com o intuito de ajudar os pequenos produtores, o PNAE legisla sobre a compra de alimentos para as escolas públicas e assegura, através do artigo 14 da lei Nº11. 947, que 30% da verba seja destinada a adquirir produtos de agricultores familiares. Em Viçosa, esse número é ultrapassado nas escolas estaduais e chega a 70% nas municipais, segundo o Secretário de Agricultura Marcos Fialho. É considerado agricultor familiar, de acordo com a lei Nº 11.326, aquele que não possui mais de 4 módulos fiscais e utiliza mão de obra predominantemente da própria família.
As Feiras Livres realizadas em Viçosa são uma das alternativas para o escoamento da produção. Em períodos normais, as feiras acontecem as quartas, sábados e domingos no Balaústre, na UFV, na Violeira, atrás do Centro Administrativo e na Praça do Rosário. (Prefeitura de Viçosa/Reprodução)
Existem iniciativas federais assegurando a garantia das exigências mínimas para a continuidade da produção durante os próximos anos. Uma delas é o Plano Safra da Agricultura Familiar 2017/2020, lançado nacionalmente com o objetivo de auxiliar o pequeno agricultor. Dessa forma é reafirmado o compromisso na ampliação de produção de alimentos e garantia de crédito mais barato.
Na microrregião, o CTA (Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata) e a EMATER (Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural), também oferecem assistência técnica aos produtores. Assim, auxiliam os pequenos produtores a aprimorar e diversificar suas produções, sem perder a essência, fortalecendo a autonomia e dando perspectiva de alcançar novos mercados e complementar a renda.
Eugênio Ferrari, um dos idealizadores do CTA e professor de Licenciatura em Educação do Campo na Universidade Federal de Viçosa (UFV), afirmou que, apesar desse suporte, Viçosa é o município dentre as cidades próximas com o menor número de agricultores familiares. Isso acontece em razão das atividades econômicas realizadas na cidade, que giram em torno do polo educacional e da construção civil. Ainda assim, os pequenos produtores compõem 85% da atividade agrícola da cidade.
De acordo com o Secretário de Agricultura, havia uma necessidade de escoamento da produção por parte desses agricultores, surgindo, assim, a “Feira da Estaçãozinha” em 2016, realizada na Praça Maestro Hervé Cordovil todas as quartas-feiras, a partir 15 horas. Além disso, as feiras dão condição ao agricultor de permanecer no campo, na nova feira a demanda foi maior do que a esperada.
Através da assistência técnica oferecida pela Prefeitura para otimizar a produção – com visitas semanais e acompanhamento regular – eles conseguiram se programar para manter suas vendas no mercado. Essa feira, porém, é exclusiva para produtores de Viçosa, o que não é regra em outras da cidade, como o “Quintal Solidário” – que também acontece às quartas a partir das 17 horas, na casa 52 da Vila Gianetti – e a “Feira Livre” – aos sábados de manhã, atrás do Centro Administrativo.
Participante da feira de sábado, Eliane Pereira, 45, é uma produtora, assim como Dona Noemy, mas seu diferencial é a venda de quitandas. Há 6 anos a moradora de Macena, zona rural de Viçosa, transforma sua própria colheita – como mandioca, banana e abóbora – em pães, bolos e roscas com a ajuda do marido e das filhas.
Seu sustento não depende apenas das feiras; ela também conta com o “dinheiro certo” do PNAE, visto que entrega seus produtos uma vez por semana nas escolas municipais. Eliane diz que se tivesse a oportunidade trabalharia com criação de galinhas e ainda acrescenta: “não saberia viver na cidade”.