Crise na educação viçosense: os estigmas deixados pela pandemia
Os impactos da pandemia de COVID-19 ainda ecoam nas escolas de Viçosa, que enfrentam um dos maiores índices de redução de matrículas no ensino fundamental. Após uma análise dos dados do Censo Escolar produzido pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira , entre 2019 e 2024 o número de alunos matriculados no Ensino Fundamental em escolas públicas caiu 10,95%, superando a média estadual, de 8,56%, e a regional, de 7,66%. A redução foi mais acentuada em áreas rurais, com uma diminuição de 16,98% nas escolas municipais, enquanto as urbanas registraram quedas de 13,75% nas estaduais e 7,40% nas municipais. Estes números refletem os desafios educacionais enfrentados pelas instituições de ensino na reintegração dos alunos a serem abordados nesta reportagem.
Inicialmente, nota-se os entraves enfrentados pelas escolas ao tentar incentivar a presença dos alunos. Segundo Denise Barbosa, diretora da Escola Municipal Coronel Antônio Silva Bernardes – CASB, apesar dos esforços em inserir novas formas de aprendizagem como oferecer salas mais atrativas, bibliotecas e laboratórios de informática, a pandemia deixou uma lacuna de interesse e proximidade entre a instituição e seus estudantes. Desse modo, o ambiente escolar começou a ser visto de forma negativa por não oferecer o mesmo conforto de suas casas durante o distanciamento. Outro fator de extrema importância, é a defasagem de aprendizado acumulada durante o tal período, tendo em vista que muitos alunos recebiam os Planos de Ensino Tutorado (PET) apostilas implementadas pela Secretaria da Educação de Minas Gerais, e não possuíam um acompanhamento pedagógico para realizar as atividades ou não compareciam as aulas no modelo remoto quando eram oferecidas.
A dificuldade de comunicação com as famílias permanece como um estigma marcante desde o princípio de 2020. A vice-diretora Conceição Paiva, também do CASB afirma que as reuniões bimestrais sobre rendimento ficam vazias, as várias ligações para resolver qualquer problema não são atendidas e a escola conta até com posts nas redes sociais para sensibilizar a visita das famílias na escola, mas sem sucesso. Em contrapartida, muitos pais queriam ajudar e participar da vida escolar dos filhos, mas não tinham conhecimento básico, alfabetização ou até mesmo computadores e rede online. Importante mencionar também a falta de acesso à internet de qualidade nas escolas públicas estaduais e municipais. Em aulas que os professores precisavam passar um vídeo, filme ou trabalho expositivo em grupo, o professor não conseguia se conectar, pois em alguns locais não funcionava ou sempre caia. Essa ausência de conexão também se fazia presente nas casas de alguns alunos, que não conseguiam se comunicar com os professores, fazer as atividades ou pesquisar conteúdos na internet.
Além disso, a quebra na rotina e o afastamento nas relações interpessoais ocasionaram certa repulsão das crianças em relação aos colégios, pois não conseguiam acompanhar o ritmo das aulas nem manter as interações uns com os outros. Em entrevista ao Correio Braziliense, a professora do ensino infantil Iuly Monteiro reafirma a importância da rotina na infância, a medida que cria uma cultura de estabelecimento de horários e hábitos, facilitando a adaptação aos momentos de estudos e realização de atividades ao longo de sua vida.
Núbia Souza, mãe de uma criança de 10 anos que deixou de ir para a escola durante o COVID-19, relata a dificuldade de adaptação no retorno. Depois de tanto tempo em casa, a interação com os amigos também foi diferente, teve um distanciamento e uma exclusão por parte de outras crianças, o que desanimava ainda mais. A família precisou contar com uma professora de apoio nessa fase. A entrevistada ainda menciona como sua saúde emocional ficou abalada e que outros pais também se ajudavam, indicando psicólogas e marcando reunião com a escola.
Os números retirados do Censo Escolar produzido pelo INEP e supracitados no primeiro parágrafo, são os resultados desses fatores e empecilhos. Viçosa, muito conhecida pela educação e por ser uma cidade universitária, não deveria ser destaque negativo entre as cidades da zona da mata. O índice registrado no município alcançou 10,95%, superando a média de 7,66% observada nas cidades de Mariana, Ouro Preto, Ponte Nova, Ubá, Visconde do Rio Branco e a média em Minas Gerais que, considerando todo o estado, foi de 8,56%. Essa realidade demonstra como muitos alunos ficaram sem educação básica e sem vivências escolares que são importantes para essa fase. Reflete também no futuro da cidade que tem estudantes cada vez mais desanimados, desacreditados e que podem não tentar prestar a prova de vestibulares para instituições como o CAP – Coluni (Colégio de Aplicação de Viçosa), por exemplo.
Em síntese, os impactos da pandemia de COVID-19 na educação da cidade revelam uma profunda crise na relação entre alunos, famílias e escolas, com consequências que ultrapassam as barreiras do aprendizado acadêmico e atingem o desenvolvimento social e emocional das crianças. A significativa redução de matrículas, aliada à defasagem educacional e à dificuldade de comunicação entre escola e comunidade, expõe os desafios enfrentados por uma cidade reconhecida pela excelência educacional. Superar essa realidade exige esforços conjuntos entre escolas, famílias e poder público para reconstruir a confiança no ambiente escolar, proporcionar suporte emocional e acadêmico aos alunos e garantir infraestrutura adequada. Somente assim será possível reverter os índices preocupantes, promover uma educação inclusiva e assegurar um futuro promissor para as próximas gerações em Viçosa.
Reportagem produzida pelas alunas: Ana Luiza Campos (113009), Caroline Paiva(113013), Gabrielle Andrade (112995), Lara Mendes (112994), Mayra Barbosa (113008) e Tayssa Lopes (112997)