Moradores da área rural de Viçosa lutam por direito de ir e vir; Conheça os Cristais II
Há 50 anos, moradora da zona rural de Viçosa, no bairro Cristais II, Dona Maria afirma que nunca viu uma obra sendo feita na região. “Só cascalho e pó de pedra em ano de eleição” é o
que afirma seu filho Wellington, quando questionado sobre a intervenção de órgãos públicos
em prol de melhorias na estrada.
Ano após ano, os moradores contornam árvores que caem e não são retiradas, enfrentam
lama em época de chuva e desviam buracos enormes no percurso. Para o morador Luiz
Carlos, a situação custou uma visita da mãe ao hospital, conforme ele afirma na entrevista
dada em 24 de fevereiro de 2021 ao jornalista e vereador Cristiano Motolink.
O estado das estradas não mudou muito desde então.
A localização do bairro explica um pouco da peculiaridade de seus desafios. Dividindo o
terreno com a UFV, a sensação da população é de que a responsabilidade pela resolução de
problemas da comunidade é passada da instituição para os órgãos municipais e vice-versa.
A repartição pouco esclarecida do que seria responsabilidade de um ou do outro contribui para a dificuldade de cobrança aos órgãos responsáveis.
Apesar de já terem sido lançados alguns calendários de reformas nas zonas rurais desde o
período mais crítico da região, em 2021, quando aconteceu o incidente relatado por Luiz
Carlos, o bairro nunca entrou nas listagens.
O chefe do Departamento de Agropecuária da Prefeitura, Reginaldo Fialho, afirma que geralmente quando uma região não está no cronograma é por ser próxima a bairros maiores.
Assim, quando as intervenções chegam ao bairro rural vizinho, Palmital, as obras tendem a chegar aos Cristais.
Ainda de acordo com Reginaldo e relatos de outros funcionários da Secretaria, os maiores obstáculos para a realização desse tipo de obra são: o teto orçamentário, a burocracia envolvida, a extensa área a ser tratada (mais de 300km), o desafio técnico de executar funções típicas da Secretaria de Obras e a necessidade, nesse caso, de intervenção dentro da propriedade dos moradores.
Para os “velhos de casa”, isso já é comum; a família de Dona Maria afirma já não ter
esperanças com a Prefeitura, preferindo se organizar com os outros da comunidade para
realizar manutenções e ‘quebra-galhos’ por conta própria.
Apesar dessa tentativa de remediar o problema, a estrada continua a chegar a estados críticos todos os anos, em parte pela influência da passagem de caminhões para escoação agrícola.
Ademar, outro morador da região, reconhece a importância do fluxo para a comunidade, mas questiona a ausência de intervenções efetivas para a eliminar a constante degradação causada pelo transporte.
Quando questionado sobre os desafios técnicos e soluções ideais para esse e outros problemas nas estradas, o professor do Departamento de Engenharia Civil da UFV, Willian Amaral, especializado em estradas e transportes, diz que “para garantir resultados mais duradouros, o patrolamento não é o suficiente.”
“É preciso uma análise do solo e a instauração de um sistema de drenagem adequado ao regime de chuva e à especificidade do solo. Só então a compactação superficial funciona; sozinha, a medida é apenas paliativa”.
Histórico e Perspectivas
Viçosa é um município em que, segundo o IBGE, mais de 90% de sua área total é rural. E, ainda assim, os problemas nas estradas não movimentadas são pautadas sem aparente resolução. Todo ano, a impressão que fica aos moradores é de retorno a estaca zero.
O Cristais II é uma região de alto contraste e possui um perfil demográfico bem heterogêneo,
como afirma Robert Lorran, mestrando em Entomologia pela UFV e morador do bairro há
um ano:
“A gente vê algumas mobilizações, como abaixo-assinados, ocasionalmente. Tem o
grupo de WhatsApp em que a galera conversa, consegue caronas, mas no geral essas
diferenças de perfil de morador […] dificultam uma frente mais unida de mobilização”.
Ele também reforça a necessidade de maior diálogo entre os moradores, para conseguirem, ao menos, visibilidade às situações enfrentadas.
Apesar das diferenças, os vizinhos têm em comum o desafio das estradas e a necessidade de
lutarem pelo direito de ir e vir, preservando a qualidade de vida e a característica “da roça”.
É o que ressalta Ana Caprini, moradora do lugar:
“Escolhemos os Cristais, além do fator financeiro, pela qualidade de vida, tranquilidade e o contato com a natureza.“
Adaptação de Reportagem da Revista PH Rolfs, nº12 – a ser publicada.