Você sabia que o SUS não é o único serviço gratuito oferecido pelo governo federal?
Assim como a saúde, a assistência social se caracteriza como uma política pública, um direito de todos os cidadãos. Então, muito semelhante ao que acontece na saúde com o SUS, os brasileiros podem ter acesso e exercer seus direitos nesta esfera através do SUAS, o Sistema Único de Assistência Social.
Criado em 2005, o SUAS organiza a política nacional de assistência e está presente em todo o Brasil, com o objetivo de garantir proteção social aos cidadãos. Definido pela Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), o SUAS representa um sistema descentralizado e participativo, que organiza a gestão das ações na área da assistência social a partir de algumas diretrizes, como: descentralização político-administrativa, participação social e predominância da responsabilidade do Estado na condução da política de assistência social.
Para além da institucionalidade, é de responsabilidade do SUAS organizar, enquanto comando único, a oferta descentralizada de serviços, benefícios, programas e projetos sociais. Essa forma de gestão representou uma inovação no modelo de gestão das políticas públicas, superando a fragmentação e a descontinuidade das ações assistenciais existentes no país até o ano de sua implementação. Isso quer dizer que, apesar de contar com uma coordenação centralizada no nível Federal, o Sistema Único de Assistência Social, assim como o SUS, conta com execução descentralizada, sendo, responsabilidade, também, dos Estados e Municípios.
A LOAS, a NOB SUAS (Norma Operacional Básica do SUAS) e outras leis que regulam a assistência social, definem também quais responsabilidades são da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no âmbito dessa gestão compartilhada. Essas responsabilidades incluem o cofinanciamento de serviços, programas e ações da assistência social. Dessa forma, a qualidade da oferta desses serviços está diretamente ligada a uma adequada gestão do trabalho no âmbito do SUAS. O dimensionamento das equipes, a capacitação dos profissionais e a estruturação das condições de trabalho são, assim, fundamentais.
CRAS e CREAS: conhece?
A LOAS também é responsável por definir os Centros de Referência, o CRAS e o CREAS. Segundo essa lei, o CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), é a unidade pública municipal, localizada em áreas com maior vulnerabilidade e risco social. Destinado à articulação e prestação dos serviços socioassistenciais em seu território de abrangência, o CRAS atua de forma a prevenir situações de vulnerabilidades e riscos sociais, desenvolvendo potencialidades através do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, e da ampliação do acesso aos direitos de cidadania.
Enquanto isso, no Centro de Referência Especializado de Assistência Social, o CREAS, são atendidos aqueles cidadãos que já tiveram seus direitos violados e/ou já estão em uma situação considerada como de risco pessoal ou social. São unidades públicas estatais que oferecem serviços de proteção especial a essas pessoas e famílias.
Estabelecendo uma comparação com algo mais próximo da realidade da maioria dos brasileiros, é como se o CRAS atuasse como as UBSs, os postos de saúde, de forma mais preventiva, representando a porta de entrada dos serviços assistenciais. Enquanto isso, o CREAS atua remediando situações já existentes, como os hospitais.
Censo SUAS, uma iniciativa de vigilância socioassistencial
Assim como o Censo Demográfico, realizado pelo IBGE com o intuito de entender a população nacional em sua quantidade, características e formas de vida, as políticas de acolhimento e assistência social também são estudadas e contabilizadas. Esse trabalho é de responsabilidade do Censo SUAS, que está sob a responsabilidade das Secretarias Nacional de Assistência Social (SNAS) e de Avaliação e Gestão da Informação (SAGI).
O Censo SUAS é um processo de monitoramento que, através de formulário eletrônico preenchido pelas Secretarias e Conselhos de Assistência Social dos Estados e Municípios, produz dados sobre a implementação das políticas assistenciais no território nacional, com foco em entender e identificar os avanços, desafios e limitações do sistema.
É através das informações obtidas por ele que um panorama geral da gestão e financiamento pode ser traçado. Isso pode ser feito observando-se aspectos como as estruturas administrativas da gestão, a atualização de normas, a transferência de recursos, o apoio de Estados a Municípios, entre outras coisas.
Patrícia Nunes Silva Elias é uma assistente social de Timóteo, Minas Gerais. Com mais de 15 anos de experiência na gestão das políticas de assistência social, Patrícia, que já atuou nas esferas municipais e estaduais do SUAS, fala sobre a importância do Censo para a manutenção dessas políticas:
2017-2023: um panorama amplo e politicamente diverso
Exemplo da importância desse monitoramento fidedigno é o Censo SUAS de 2017, responsável por apresentar, através de observação dos dados e outros recursos, a crescente no número de CRAS entre os anos de 2010 e 2017. No ano em questão, o número de Centros de Referência de Assistência Social atingiu a marca de 8.292 unidades, um avanço considerável em comparação às 6.801 unidades que existiam em 2010. Outro feito do Censo SUAS daquele ano foi o de demonstrar como o número de municípios com CRAS acompanhou essa tendência de crescimento, chegando a 5.512 municípios, também em 2017 (um aumento de 792 municípios quando comparado ao ano de 2010).
Comparar recortes temporais é importante dentro das análises possíveis com o Censo, pois, como o SUS, esse sistema sofre mudanças conforme os governos vigentes. Subordinado à Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS), o ministério que cuida do SUAS já teve vários nomes entre os anos de 2017 e 2023:
- Sob o mandato presidencial de Michel Temer (2016-2019), o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário esteve sob responsabilidade de Osmar Terra (MDB) entre 2016 e abril de 2018. Naquele ano, também, em abril, foi nomeado como ministro Alberto Beltrame, que permaneceu no cargo até o fim do mandato, em janeiro de 2019.
- No governo presidido por Jair Bolsonaro (2019-2022), a assistência social foi inserida no “Superministério” da Cidadania, composto pela fusão dos Ministérios da Cultura, Desenvolvimento Social, Esporte e parte do Ministério do Trabalho; que teve como ministro em sua criação Osmar Terra, do MDB-RS.
- Atualmente, o Ministério do Desenvolvimento Social tem o nome de “Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome” e seu ministro é Wellington Dias, do PT-Piauí.
Conforme os governos passam, os ministérios e as formas de abordagem das políticas públicas no país mudam. Apesar disso, conforme dados do Censo SUAS do período em questão (2017 a 2023), é possível observar que a quantidade de CRAS e CREAS pelo território se manteve numa crescente estável.
Estruturação da Rede de Serviços do Sistema Único de Assistência Social
O Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) é o fundo público responsável por fornecer recursos e cofinanciar gestão, serviços, programas, benefícios e projetos de assistência social. Através do Portal da Transparência é possível observar onde e como a verba orçamentária do fundo foi utilizada.
Assim, quando o assunto é a estrutura da rede de serviços do SUAS, onde estão presentes as unidades do CRAS e CREAS, foram destinados pouco mais de 148,27 milhões de reais em 2021. No ano de 2022, o salto orçamentário foi considerável, com mais ou menos 1,4 bilhões de reais investidos. Já em 2023, mesmo com a mudança governamental, o salto não foi grande e pouco mais de 1,7 bilhões de reais foram investidos.
Apesar dos grandes números em 2022, fica claro, através dos dados do Censo SUAS disponíveis no gráfico acima, como o impacto no número de unidades do CRAS e CREAS não foi tão forte. De 2021 para 2022, período que representa maior salto orçamentário, o número de CREAS sofreu um aumento de 64 unidades e o de CRAS, um aumento de 87 unidades.
Segundo Aline Formiga Monteiro Penha, assistente social, “a descentralização político-administrativa foi uma forma de dar poder aos Estados e Municípios de conduzirem uma gestão mais autônoma. Então, apesar de o cofinanciamento estar no regulamento e Estados e União precisarem contribuir financeiramente para a implementação das políticas de assistência pública, é nos Municípios que a coisa realmente acontece. São os Municípios que conhecem as suas demandas e necessidades. E, nesse sentido, a descentralização acaba dando um pouco mais de autonomia para a gestão.”
Ainda segundo a assistente social, “Às vezes acaba que essa descentralização é prejudicial para os Municípios. Isso porque descentralizam-se as responsabilidades, mas o cofinanciamento não é suficiente para dar conta das demandas que são apresentadas. Essa é a grande crítica à descentralização político-administrativa: as responsabilidades são descentralizadas, mas a verba, o dinheiro mesmo, não segue o mesmo caminho.”
Por Júlia Nunes e Vitória Pereira para a disciplina de Jornalismo Online.