De uma juventude conturbada ao topo do mundo de Jiu-Jitsu: a história de Robert Bochecha
Robert Rodrigues da Silva, mais conhecido como “Bochecha”, é natural de Viçosa e atleta profissional de jiu-jitsu e MMA. Atualmente, ele divide seu tempo entre ministrar aulas no Centro de Treinamento WR, manter sua rotina de treinos — embora em um ritmo menos intenso do que em outros momentos de sua carreira — e participar de campeonatos regionais de jiu-jitsu. Com isso, consolidou-se como uma referência nas artes marciais em Minas Gerais.
No entanto, quem o vê no topo do pódio talvez não imagine os desafios que enfrentou para alcançar seus objetivos.
Juventude conturbada e amor pela luta
Bochecha nasceu em 14 de março de 1995, e desde cedo desenvolveu uma paixão pelas artes marciais, um esporte que o fascinava mesmo em um país dominado pela cultura do futebol.
Aos 11 anos, começou a treinar jiu-jitsu em um projeto na cidade chamado AJUDOU sob uma única condição: para participar de horários pagantes nos treinamentos, Bochecha precisava ficar responsável pela limpeza do tatame, e assim se preparou para participar de sua primeira competição, a Copa Budo, em Juiz de Fora.
Não demorou para voltar aos tatames, competindo novamente em Belo Horizonte no mesmo ano.
Neste período, ele conheceu Wagner e Rodrigo do CT WR, que na época eram competidores assim como Bochecha, que estava no inicio de sua carreira.
Os dois davam muito suporte a Robert, tanto financeiro quanto psicológico, o motivando a competir em disputas regionais, mesmo ele não sendo premiado em dinheiro por ainda ser uma criança. Dessa forma, ali se construiu uma grande amizade.
Em 2008, aconteceu sua primeira competição fora do estado, a World Cup, em São Paulo. Foi lá que conheceu o mestre Luiz Guilherme, carinhosamente chamado de “Guigo”, com quem criou uma forte ligação.
Guigo se tornaria uma figura fundamental em sua trajetória, sendo um mentor presente em grande parte de sua vida esportiva.
De volta a Viçosa, Robert insistiu para que sua mãe o deixasse mudar-se para São Paulo, onde poderia treinar com Guigo e se preparar melhor para as competições. Inicialmente, sua mãe negou o pedido, mas, em 2009, um evento traumático mudou o rumo de suas vidas.
Durante o processo de divórcio dos pais, seu pai, insatisfeito com as separações financeiras do acordo, colocou fogo na própria casa. Esse episódio gerou uma grande revolta em Robert, e, temendo que ele seguisse um caminho ruim, sua mãe finalmente permitiu que ele fosse para São Paulo.
Ao chegar à maior cidade do país, Bochecha encontrou em Guigo mais do que um mestre: um verdadeiro suporte. Lá, ele chegou exclusivamente para ser atleta e construir uma trajetória para lá de vitoriosa.
Início dos treinamentos
Assim que chegou a São Paulo, Bochecha passou por um processo de ganhar a confiança dos companheiros de tatame. Por ser um jovem atleta do interior de Minas Gerais, no qual Guigo estava depositando grandes expectativas e investindo dinheiro, muitos dos lutadores que já estavam lá sentiam certo ciúme dele e lutavam com mais intensidade justamente para se provarem diante do mestre.
Durante esse período, Bochecha passou pouco mais de um mês “apanhando” dos companheiros, até criar intimidade e se acostumar ao ritmo dos treinamentos. A partir dali, a relação de Robert com os demais atletas do CT de Guigo só se fortaleceu, construindo amizades que mantém até hoje.
Foi assim que se desenvolveram os treinamentos de Robert para o Mundial de sua categoria, que ocorreu em 2010. Nesse torneio, Bochecha lutou e conquistou sua vitória.
O topo do mundo de Jiu-Jitsu
O campeonato internacional se aproximava, e naquele momento ele tinha duas opções: inscrever-se na categoria juvenil, onde era o grande favorito e cujo prêmio era um videogame que poderia ser vendido para ajudar a pagar sua passagem para o Mundial na Califórnia, ou tentar a sorte na categoria adulto, com competidores mais experientes.
Quando Guigo descobriu que Bochecha havia trocado o certo pelo duvidoso, deixando de competir na categoria juvenil para desafiar a categoria adulta, o treinador ficou bastante bravo.
No entanto, ele não sabia que, mesmo enfrentando adversários mais fortes e experientes, Bochecha venceria o campeonato e conquistaria sua vaga para o Mundial em Long Beach, na Califórnia.
No fim, Guigo estava disposto a pagar a inscrição de seu atleta para o Mundial, mas não esperava que Bochecha escolhesse o caminho mais difícil para se classificar.
Em 2012, chegando ao que talvez fosse o principal campeonato de sua carreira, na Califórnia, Bochecha sagrou-se campeão de sua categoria, que na época era até 100 kg. O que parecia incerto na visão de Guigo acabou se consolidando, e Bochecha voltou para casa com uma medalha no peito.
A seletiva de Abu Dhabi
Em 2013, os desafios continuaram na vida de Robert. Na ocasião, houve quatro seleções ao redor do Brasil para serem classificadas para o Mundial daquele ano em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos.
Guigo, então, orientou Bochecha, que estava de férias em Viçosa, a ir até Niterói para se acostumar ao ritmo de lutas e às novas regras, já que a competição era organizada por uma federação diferente.
O objetivo inicial era que esse período servisse como um “treinamento” para que ele competisse para valer na seletiva em Gramado, no Rio Grande do Sul. No entanto, Bochecha surpreendeu ao tornar-se campeão da seletiva em Niterói, garantindo sua vaga no Mundial.
Na competição, Bochecha foi eliminado nas semifinais de sua categoria, que foi dividida por peso. Contudo, por ter ficado entre os quatro primeiros, ele foi classificado para as finais da categoria absoluta, que não era limitada por peso, o que poderia fazê-lo enfrentar adversários muito maiores.
No dia seguinte, após a derrota nas semifinais, Bochecha venceu o mesmo adversário na final do absoluto, garantindo sua ida ao Oriente Médio. Sua mãe e sua irmã, que saíram de Viçosa para o Rio de Janeiro, estavam lá para prestigiar essa conquista.
Bochecha, então, embarcou para aquela que seria a maior oportunidade de sua vida. Com tudo pago, ele passou nove dias hospedado em um hotel seis estrelas em Abu Dhabi. Embora tenha sido eliminado precocemente na competição, a experiência foi marcante e permanece viva em suas memórias.
O que a luta proporcionou na vida de Bochecha
Ao longo de sua vida, Bochecha criou diversos laços com todos aqueles que, de alguma forma, o ajudaram em sua caminhada.
Em 2014, quando finalmente voltou a Viçosa, Robert recebeu o apoio de Rodrigo e Wagner e passou a ministrar aulas, atividade essa que realiza até hoje, seja com crianças ou com pessoas mais velhas.
Claro, Bochecha continua competindo de forma um pouco mais esporádica, chegando a se aventurar no mundo do MMA, onde, até a escrita deste texto, soma três lutas e três vitórias.
A luta definitivamente, como ele próprio relata, mudou completamente os rumos de sua vida. Proporcionou-lhe a oportunidade de competir, vencer, aprender, conhecer o mundo e, principalmente, criar vínculos. Pode-se dizer que ele ganhou duas famílias: o mestre Guigo e o CT WR.
Hoje, aos 29 anos, Bochecha está de forma definitiva em Viçosa, trazendo consigo uma carreira marcada por muita superação. Da zona da mata aos principais palcos do jiu-jitsu no mundo, sua trajetória é a verdadeira história de um campeão.