A enfermidade passou a ser considerada pela OMS, no ano passado, como doença ocupacional e, portanto, associada ao trabalho. Conheça seus principais sintomas, fatores de risco e formas de prevenção.
-24 de outubro de 2024
A enfermidade passou a ser considerada pela OMS, no ano passado, como doença ocupacional e, portanto, associada ao trabalho. Conheça seus principais sintomas, fatores de risco e formas de prevenção.
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Pesquisa realizada pelo International Stress Management Association (ISMA-BR), em 2019, mostra que o Brasil é o segundo país do mundo com mais casos da Síndrome de Burnout, ficando atrás apenas do Japão. Recentemente, em 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS), passou a considerar a Síndrome como uma doença ocupacional, tornando-a um fenômeno ligado ao trabalho e não ao trabalhador, o que confere tratativas e direitos especiais aos profissionais acometidos pela Síndrome de Burnout, caracterizada, pelo Ministério da Saúde como um distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastantes, que demandam muita competitividade ou responsabilidade, mais comum entre profissionais que atuam diariamente sob pressão como médicos, professores e bombeiros, por exemplo.
Até o reconhecimento da OMS da Síndrome de Burnout como doença ocupacional, ela era descrita apenas como um “estado de exaustão vital” e podia ser interpretada inclusive como resultado de um infortúnio em casa ou na família. Com a mudança, os indivíduos diagnosticados com a doença passaram a ter as mesmas garantias trabalhistas e previdenciárias previstas para as demais doenças do trabalho.
No Brasil, pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) em 2021, revelou que 18% dos brasileiros eram vítimas da Síndrome, sendo que a maioria com idade inferior a 30 anos. Nesta reportagem, o OutrOlhar conversou com profissionais da área da Saúde e do Direito, para compreender melhor os sintomas da Síndrome de Burnout, seu diagnóstico, formas de tratamento e de prevenção, além de abordar os direitos dos profissionais acometidos pela Síndrome.
Os primeiros sinais da Síndrome são fadiga, falta de concentração, distúrbios do sono como sonolência excessiva ou insônia devido ao estresse, quando a pessoa não consegue se desligar das questões do trabalho. Podem ocorrer também alterações no humor, irritabilidade, isolamento social e dores de cabeça ou musculares.
Segundo o Ministério da Saúde, normalmente esses sintomas surgem de forma leve, mas tendem a piorar com o passar dos dias. Por essa razão, muitas pessoas acham que o que estão sentindo pode ser algo passageiro, pois os sintomas podem levar a essa impressão mas também podem indicar o início da Síndrome de Burnout. Então, para evitar problemas mais sérios e complicações da doença, é fundamental buscar apoio profissional assim que notar qualquer sinal.
De acordo com a psicóloga Stefanie Oliveira, que atende na cidade de Viçosa, em Minas Gerais, quando o Burnout alcança níveis mais extremos, normalmente no momento em que as pessoas começam a se preocupar, elas podem sofrer apagões, ter perda de memória a curto prazo e até esquecer como desenvolver alguma atividade que sempre fizeram. A paralisia em um lado da face também pode ser um sintoma que leva a pessoa para um hospital.
A literatura mostra que os profissionais mais sujeitos a terem a Síndrome são aqueles que trabalham sob muita pressão e os que possuem uma longa jornada de trabalho. Além disso, alguns fatores pessoais como problemas psicológicos anteriores ao trabalho, ansiedade, depressão, bipolaridade e baixo nível de tolerância à frustração, quando a pessoa tem uma autocobrança muito grande, podem contribuir para o desenvolvimento da Síndrome. Conforme os especialistas, algumas vezes o trabalho nem exige tanto, mas a própria pessoa cria essa exigência o que pode ocasionar um estresse muito alto no trabalho e contribuir para o aparecimento da Síndrome de Burnout que, como se pode perceber, é bastante complexa.
Recentemente, com a pandemia, o trabalho remoto, com suas particularidades contribuiu muito para o desenvolvimento do Burnout. Conforme explica a psicóloga Stefanie Oliveira, o próprio uso prolongado de telas é estressante e, durante a pandemia da covid-19, o trabalho ficou à disposição da pessoa durante todo momento em sua casa, tornando-se mais difícil se desligar das atividades da empresa. Além disso, quando o profissional trabalha de casa, os problemas pessoais cruzam diretamente com o trabalho, podendo ocasionar um estresse simultâneo entre as situações dos dois ambientes. Essas são características inerentes ao trabalho remoto, intensificado após a pandemia.
Identificados os sintomas do Burnout, a pessoa deve procurar a ajuda de um psicólogo ou psiquiatra, que são os profissionais habilitados e indicados para confirmarem ou não o diagnóstico da Síndrome e indicarem o tratamento. O reconhecimento do problema é feito por meio de uma entrevista clínica ou de uma avaliação psicológica com investigação mais detalhada realizada com o apoio de testes e questionários específicos para identificar a Síndrome de Burnout.
A psicoterapia é o principal tratamento da Síndrome, mas também pode ser associada à prescrição de medicamentos (antidepressivos e/ou ansiolíticos). Além do tratamento com psicólogos e psiquiatras, é indicado que a pessoa altere seu estilo de vida, cuide melhor da alimentação, durma bem, faça atividades físicas e passe mais tempo ao ar livre.
Para prevenir o Burnout, existem algumas ações que, tanto o trabalhador quanto os empregadores podem tomar. De acordo com a psicóloga Stefanie Oliveira, o ambiente de trabalho é fator relevante para evitar a Síndrome: “ele deve ser o mais colaborativo possível, evitando altos níveis de exigência tanto por parte de um superior, dos colegas de trabalho ou da própria pessoa. Se você tem uma tarefa muito difícil de executar e tem um ambiente de trabalho colaborativo, leve, você não vai ter tanto sofrimento, tanta pressão para concluir uma tarefa, porque sabe que tem com quem contar”, explica. Sendo assim, o ideal é que os chefes repensem o alto nível de exigência e de cobrança, que contribuam para tornar o ambiente de trabalho agradável, que forneçam recursos suficientes para que o empregado execute as suas tarefas, que respeitem a jornada de trabalho, as férias, os feriados e horários de almoço.
Stefanie Oliveira orienta que os trabalhadores não esperem o esgotamento chegar a níveis extremos para procurar ajuda profissional. “Se está com dificuldades, procure ajuda psicológica, psiquiátrica, antes de se tornar uma grande bola de neve e virar uma Síndrome de Burnout. Alguns sintomas são muito graves e complicados e a pessoa nem consegue voltar ao trabalho, então procure um profissional de saúde mental. Àquelas pessoas com altos níveis de exigência, de cobranças, perfeccionismo, a terapia também pode ajudar, porque esses são fatores que atrapalham e contribuem para o estresse no trabalho”, conclui a psicóloga.
O afastamento em decorrência de adoecimentos mentais, entre elas o Burnout, tem crescido ao longo dos últimos anos no Brasil e se tornado uma das principais causas de afastamento pelo Instituto Nacional do Seguro Social (Inss), segundo a Procuradora do Trabalho do Estado de São Paulo, Adriane Reis de Araújo. Ainda de acordo com a Procuradora, mesmo que os trabalhadores não tenham total conhecimento sobre todos os seus direitos nesses casos, os médicos do trabalho já estão mais atentos em relação a essa questão e as empresas têm se preocupado mais com a saúde mental dos empregados. “Nós temos conhecimento de algumas iniciativas para evitar o estigma desses trabalhadores relacionado à saúde mental, outras iniciativas para falar sobre esse problema e até incentivos para se ter uma vida mais saudável”, conclui a Procuradora Regional do Trabalho.
O diagnóstico da Síndrome de Burnout, atestado por um profissional da saúde, seja um médico trabalhista, um psiquiatra ou um psicólogo, o trabalhador possui direitos trabalhistas, regulamentados pela Lei 8.213. Para garanti-los, o primeiro passo do trabalhador deve ser a obtenção desse diagnóstico relacionando e vinculando os sintomas do Burnout ao trabalho, que podem aparecer como decorrência de uma mudança de função ou mesmo do excesso de demandas entre outras questões. Essa comprovação é fundamental, especialmente se o empregado precisa se afastar em decorrência do enfrentamento de uma situação aguda de estresse, que gera incapacidade momentânea para o trabalho, conforme explica a Procuradora Adriane Reis de Araújo. Nesses casos, o médico emite a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), documento que informa ao Inss que o trabalhador sofreu acidente de trabalho ou suspeita-se que tenha adquirido uma doença de trabalho.
No entanto, caso “o trabalhador, ou trabalhadora, sinta a situação de adoecimento do Burnout, busque o médico do trabalho, e este médico ainda assim não concede a licença médica, principalmente o médico do trabalho da empresa, o trabalhador ou a trabalhadora também pode recorrer ao sindicato de sua categoria, autorizado a emitir a CAT e buscar o suporte do Inss” explica a Procuradora do Trabalho.
Quando o afastamento do trabalhador ultrapassa os 15 dias, ele recebe, do Inss, o auxílio-doença. Durante o período de afastamento e recebimento deste auxílio, é direito o reconhecimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (Fgts). O Burnout também concede estabilidade empregatícia de um ano, ou seja, após o tratamento, o funcionário que volta ao ambiente de trabalho não pode ser demitido nos próximos 12 meses, exceto nos casos de justa causa.
Em alguns casos, o empregado também tem direito a indenização se comprovado o nexo causal entre a doença e o trabalho exercido. O trabalhador também pode rescindir o contrato de trabalho indiretamente. Nesse caso, o empregador deverá pagar todos os direitos como aviso prévio, 13° salário, férias atrasadas e multa de 40% sobre o Fgts.
Mais informações sobre o Burnout você confere nesta cartilha produzida pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae/CE).