Pesquisas sobre o uso medicinal da cannabis avançam no brasil
Utilizada desde a antiguidade para tratar dores e inflamações, a Cannabis, conhecida popularmente como maconha, é criminalizada no país desde 1938. Hoje, 17 grupos de pesquisa brasileiros desenvolvem estudos que ratificam e valorizam seu uso medicinal
O uso medicinal da Cannabis, planta originária das regiões do sul e do centro da Ásia, possui registros desde 2.700 a.C. Conforme consta no livro “Pen Ts’ao Ching” sobre farmacopeia chinesa, ela era utilizada para combater dores articulares. No Egito antigo, o “Papyrus Ebers” – tratado médico mais antigo da história da humanidade, publicado em torno de 1500 a.C. -, recomenda o uso da Cannabis para tratamento de inflamação e cólica menstrual. Além do uso medicinal, a planta faz parte da cultura e de rituais de várias civilizações, sendo utilizada, também, para a confecção de fibras na fabricação de roupas e cordas.
No Brasil, segundo E. A. Carlini, médico e pesquisador da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), a origem da Cannabis coincide com a história do próprio país. De acordo com documentos oficiais do governo, a planta foi introduzida em território brasileiro a partir de 1549, por meio dos povos africanos escravizados. Conforme o artigo, naquela época, a coroa portuguesa incentivou o cultivo da planta que era conhecida como “cânhamo”, em razão do seu potencial para o comércio.
No entanto, ao longo do tempo, o consumo e o uso da erva foi sendo relacionado à depravação moral e à criminalidade, resultando em uma política de proibição dura. Assim, a lei de fiscalização de entorpecentes, criada em 1938, criminalizou a utilização da Cannabis no país. Essa política limita, até hoje, a realização de pesquisas científicas com a maconha no Brasil, mas há esforços sendo feitos para fomentar o conhecimento e o uso terapêutico dessa planta. Atualmente, existem 17 grupos de pesquisas que estudam a Cannabis, de acordo com o Diretório dos Grupos de Pesquisa no Brasil do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
O Grupo Brasileiro de Estudos sobre a Cannabis Sativa L. (GBEC), da Universidade Federal de Viçosa (UFV) é um deles. Vinculado à ADWA Cannabis, empresa de desenvolvimento de pesquisas e tecnologias voltadas à cadeia produtiva da planta, o GBEC é liderado pelo mestre e doutorando em Fitotecnia pela UFV, Sérgio Barbosa Ferreira Rocha.
Quando começou seus estudos sobre a planta, ainda na graduação, o pesquisador percebeu a necessidade de avançar em perspectivas para além daquelas ligadas à criminalização. A partir do avanço no debate sobre o autocultivo e o uso medicinal, Rocha fundou em 2017 a ADWA – startup que cultiva, experimentalmente na UFV, a planta com fins medicinais e científicos, buscando desenvolver variedades comerciais mais produtivas, resistentes a pragas/doenças e adaptadas às condições de clima/solo da região viçosense.
O estudioso destaca que o avanço e a facilitação da pesquisa sobre a Cannabis depende de uma melhor conscientização social da população e das futuras gerações. Além disso, segundo o pesquisador, a legislação precisa avançar. A esperança de mudança está no projeto de lei PL 399/2015, que prevê a viabilização do comércio de “medicamentos que contenham extratos, substratos ou partes da planta Cannabis sativa em sua formulação”.