Políticas públicas são fundamentais para garantir direitos aos jovens

O Estatuto da Juventude, que já completou dez anos, estabelece direitos específicos para brasileiros e brasileiras que têm de 15 a 29 anos de idade. Mas os desafios são muitos. Para tratar sobre o assunto, o OutrOlhar conversou com um especialista

Por Juliana Dias e Pedro Carvalho

A Constituição Brasileira é composta por uma série de leis e determinações que, em teoria, promovem uma sociedade justa e igualitária. No entanto, frente à realidade do país nos dias de hoje, principalmente diante do contexto socioeconômico de grande parte da população, não é novidade para os brasileiros que o Estado falhou e permanece falhando ao garantir diversos direitos previstos pela Carta Magna, como aqueles estabelecidos no Estatuto da Juventude.

Instituído pela Lei nº 12.852 de 5 de Agosto de 2013, o Estatuto da Juventude  completou dez anos de vigência em 2023. Por meio dele, são postulados 11 direitos específicos, além de princípios e diretrizes das políticas públicas para a juventude, brasileiros e brasileiras que têm de 15 a 29 anos de idade. Conforme o Estatuto da Juventude, as jovens e os jovens brasileiros têm preservados o:

  1. Direito à cidadania e à participação social e política;
  2. Direito à educação;
  3. Direito à profissionalização, ao trabalho e à renda;
  4. Direito à diversidade e à igualdade;
  5. Direito à saúde;
  6. Direito à cultura;
  7. Direito à comunicação e à liberdade de expressão;
  8. Direito ao desporto e ao lazer;
  9. Direito ao território e à mobilidade;
  10. Direito à sustentabilidade e ao meio ambiente;
  11. Direito à segurança e ao acesso à justiça.

Em uma década, os desafios para cumprir o que propõe o Estatuto da Juventude são evidentes e podem ser percebidos, diariamente, por meio de notícias que veiculam os obstáculos para assegurar saúde, educação, segurança e cultura aos jovens brasileiros. Entre eles, está a dificuldade enfrentada pela juventude para sua inserção no mercado de trabalho. 

Ainda que o Estatuto determine o direito à educação e o direito à profissionalização, ao trabalho e à renda, segundo dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 2022, um em cada quatro jovens brasileiros não trabalha e nem estuda, o que corresponde a 23% da população que tem de 15 a 24 anos de idade. O dado situa o país como o que tem a taxa média de desemprego jovem mais elevada da América Latina.

Além disso, por mais que o direito à segurança e ao acesso à justiça sejam garantidos por lei, o Brasil está entre os países que mais matam jovens no mundo, de acordo com informações da Organização das Nações Unidas (ONU). Ainda, a pesquisadora do Instituto Oswaldo Cruz, Fátima Cecchetto, acrescenta que a juventude pobre costuma ser a camada da população mais afetada pela violência e pela falta de segurança, em decorrência de sua vulnerabilidade.

Para melhor compreender essa problemática, o OUTROLHAR conversou com o advogado Wellington Motta, que esclareceu o assunto sob a perspectiva jurídica e social. 

OutrOlhar (OO): Partindo de um contexto geral, quais são os desafios enfrentados pelo Estatuto da Juventude para, de fato, garantir tudo aquilo a que ele se propõe?

Wellington Motta (WM): O Estado é como se fosse o alfaiate que tenta adequar o corpo ao terno e não o terno ao corpo. Se o terno não cabe, corta as mangas para poder caber. Hoje se busca um enfrentamento com o jovem, como responsabilização por alguns atos, quando, na verdade, o que falta é a visão prática, é a questão da educação. Educação não é uma atividade que gera um resultado imediato. Ele se prolonga no tempo, um adolescente que é bem educado hoje, só vai dar resultado daqui a dez, 15 anos, quando adulto. Só que isso é como obra de saneamento, fica embaixo da terra. A próxima legislatura que vai colher os frutos de quem plantou aqui, então não tem muito interesse do Estado.

OO: Mesmo com todos os desafios, a existência de um Estatuto da Juventude permanece sendo importante?

WM: Tem uma brincadeira no Instagram de uma mãe sentada na calçada lendo a Constituição dizendo: aqui filha, você tem direito a três refeições por dia, mas ela era uma moradora de rua. O legislador adora colocar no papel alguns direitos, mas não coloca como efetivar esses direitos. A sociedade vê aquilo como uma grande vitória, mas qual é a política pública que vai ser aplicada de fato para poder chegar àquele objetivo proposto pelo Estatuto? Não tem. Não adianta estar no papel, ela precisa sair do papel e ir para a prática, porque o que está escrito na lei não altera a vida do cidadão. O cidadão médio sequer faz ideia de que existe.

OO: O caminho ideal, então, seria a implementação de políticas públicas mais eficazes?

WM: No Brasil, a gente tem excesso de lei. Temos leis para tudo. O país tem um arcabouço jurídico já extenso. O que precisamos não é nem de mais leis, mas que elas sejam cumpridas de fato, porque temos tantas leis, que desconsideramos 90% delas. Nem mesmo um juiz consegue dar conta de todas as leis.

OO: Pesquisas apontam que os principais desafios enfrentados pela juventude brasileira são o desemprego, o acesso à educação e a falta de segurança. Na sua visão, quais são os maiores problemas que a juventude precisa lidar no país hoje?

WM: Primeiro, deveria se focar na educação básica. Começar a construir o prédio da estrutura, desde o primário ao segundo grau de instrução para depois partir para a faculdade, porque aí você daria uma linha completa da educação. O segundo ponto é a questão familiar. Hoje eu vejo que tem ocorrido uma mudança do Ministério Público nesse aspecto. A lei sempre trouxe a responsabilização criminal do abandono intelectual e hoje está sendo levada a efeito. O promotor de Justiça tem cobrado, de fato, e responsabilizado os pais por isso. Em relação ao mercado de trabalho, acho que houve um pequeno avanço. Hoje a gente tem política pública para essa população, como o jovem aprendiz. Só que não é do porte que eu acho que seria o necessário. Hoje, grande parte dos jovens que ainda ficam ociosos às vezes nem é por vontade própria. Muitas vezes é porque não conseguem um trabalho. O Estado precisa implementar políticas públicas para evitar que esse adolescente termine a vida no mundo do crime.

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