20 anos de histórias com o OutrOlhar: transformações, desafios e aprendizados
O jornal-laboratório OutrOlhar, vinculado ao curso de Comunicação Social – Jornalismo da UFV (Universidade Federal de Viçosa), completou duas décadas de história em 2023. Fundado em 2003, apenas dois anos após a criação do Curso, o jornal passou por transformações ao longo dessas duas décadas e se consolidou como importante atividade de aprendizagem e experimentação para os estudantes de Jornalismo. Pode-se ainda destacar seu potencial como agente transformador, pois proporcionou um rico diálogo entre a Universidade e a comunidade viçosense.
O OutrOlhar teve início como atividade facultativa para os estudantes do Curso de Comunicação Social – Jornalismo, mas em 2005 tornou-se uma produção obrigatória, inserida nas disciplinas de “Atividades Programadas de Jornalismo Impresso” e “Edição”. Em uma entrevista realizada para a edição especial de dezembro de 2013, a então editora e uma das fundadoras do jornal, professora Adriana Araújo Passos, revelou que a criação do jornal-laboratório atendia a uma exigência do Ministério da Educação (MEC) e supria a necessidade de estudantes e professores por um espaço de exercício jornalístico, já que na época não existiam laboratórios de rádio e televisão.
A professora Mariana Ramalho Procópio, que foi estudante da terceira turma do Curso de Comunicação Social – Jornalismo da UFV em 2003 e foi chefe do Departamento de Comunicação quando o OutrOlhar completou 20 anos, destacou a importância do jornal como uma oportunidade para os estudantes vivenciarem processos jornalísticos reais, desde a apuração até a interação com o público. Mariana Procópio também ressaltou que o jornal proporciona uma linguagem e um enquadramento diferenciados, explorando temas que nem sempre são abordados pela mídia local.
“O meu primeiro contato com o jornal OutrOlhar foi ainda na condição de estudante, mas sem fazer parte da turma que elaborou aquela edição. Me lembro que no meu primeiro ano de curso eu tinha chegado em casa para as férias de fim de ano e nós recebemos a primeira edição do jornal OutrOlhar em casa, no nosso endereço. Para mim aquilo foi uma experiência muito legal, porque era a primeira edição e o jornal era feito por estudantes, colegas veteranos, e que a gente tinha oportunidade de mostrar para amigos, parentes e registrar esse momento de inauguração da produção laboratorial”, relata a professora, que entrou para a Universidade no mesmo ano da publicação da primeira edição do OutrOlhar.
A entrevista completa você confere aqui:
Em sua trajetória, além de consolidar-se como espaço de experimentação e aprendizagem para os estudantes de Jornalismo, o OutrOlhar também abriu portas para o futuro profissional, conforme conta a repórter da TV Integração Uberlândia, Valéria Almeida, formada em Comunicação Social – Jornalismo pela UFV em 2007. Ela teve seu primeiro contato com o jornal-laboratório em 2004, por meio da disciplina ministrada pelo professor Ernane Rabelo. Para ela, escrever e ter seus textos publicados no jornal era motivador, pois permitia que ela vivenciasse o Jornalismo durante sua formação acadêmica. Além disso, o jornal-laboratório desempenhou um papel fundamental para sua entrada no mercado de trabalho. Quando ela decidiu buscar oportunidades na cidade de Montes Claros (MG), seu único portfólio profissional foram as matérias publicadas no OutrOlhar. Esse material foi levado aos veículos de comunicação em Montes Claros, e um editor-chefe ficou impressionado com seus textos e a contratou.
Reprodução: Valéria Almeida
Confira o áudio onde ela conta esta experiência:
Outro profissional que destaca a importância do OutrOlhar na sua formação profissional é o jornalista da Folha da Mata, jornal de Viçosa e região, Francisco de Castro, mais conhecido como Jeremias. Ele se formou na UFV e relata que quando ingressou no Curso em 2004, já tinha uma boa experiência no jornalismo impresso, mesmo assim viu o aprendizado no jornal-laboratório como algo valioso. Para Jeremias, o OutrOlhar abriu horizontes e trouxe a experiência do dia a dia do jornalismo, sobretudo o de rua e de presença, ressaltando que mesmo com a evolução do jornalismo online, é o jornalismo tradicional que exige a presença física, é indispensável para a investigação da notícia.
“A proposta do OutrOlhar era vivenciar o jornalismo impresso, o dia a dia e as frustrações. Porque a experiência do jornalista não se constrói só daquilo que é de imediato, mas também pelas preocupações que ele passa na profissão. No OutrOlhar, a gente entrevistava profissionais, muitas vezes profissionais liberais. Você corria atrás de uma história. O OutrOlhar é quase um jornal revista. Um laboratório para você experimentar outras sensações que não são essas do dia a dia dos jornais tradicionais”, conta.
Reprodução: Laura Souza eAna Vitória
Francisco de Castro, o Jeremias, destaca que todos os momentos no OutrOlhar foram especiais e que a vivência com o jornal-laboratório foi muito importante. Assim como a professora Mariana Procópio, ele mencionou o prazer, como estudante, de ver o trabalho impresso. E quando o jornal era distribuído, o retorno que recebiam era positivo, com elogios das pessoas que viam suas matérias publicadas.
A atual diretora de Comunicação Institucional da UFV, Monique Bertto, também se formou na Universidade em 2016 e lembra da participação no OutrOlhar em 2013. Sua turma foi responsável pelas edições comemorativas dos dez anos do jornal-laboratório, o que marcou uma reformulação no design gráfico e no direcionamento editorial do jornal naquela época. Além disso, para ela, o jornal teve ainda outro marco, inspirando a definição da temática de seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). A comunidade quilombola de Buieié, localizada em Viçosa, foi tema de matéria publicada na primeira edição do OutrOlhar e, posteriormente, foi resgatada na edição comemorativa dos dez anos, tornando-se, depois, tema do documentário produzido para o seu TCC.
Monique também participou de uma edição extra direcionada ao público mais jovem, denominada OutrOlhar Júnior. Nessa edição especial, o jornal adotou uma abordagem diferente, com linguagem acessível e pautas relevantes para estudantes do Ensino Fundamental. O objetivo dessa experiência foi propiciar o consumo de produções jornalísticas desde cedo, visando despertar o interesse e a identificação de estudantes do Ensino Fundamental com o conteúdo jornalístico.
“Eu acho que o OutrOlhar enquanto um espaço de experimentação, é importantíssimo. É realmente um laboratório para a gente explorar a prática jornalística, mas também aquilo que a gente tem de bagagem pessoal, os nossos desejos, aquilo que a gente imagina que profissionalmente a gente pode fazer. E é legal ver como ele acompanha realmente as mudanças que acontecem no mundo, ele vai se atualizando e vai atendendo também essa demanda que a gente tem de atualização na forma da gente adquirir conhecimento e se profissionalizar. E para a comunidade também trazendo uma abordagem diferente sobre alguns assuntos e, principalmente, do ponto de vista dos estudantes”.
Reprodução: Pedro Augusto
Em suas duas décadas, o OutrOlhar conta com mais de 60 edições publicadas e inúmeros leitores e passou por várias transformações em seu percurso. Inicialmente, o jornal não tinha um público muito bem definido e abordava assuntos de interesse da comunidade viçosense no geral. A partir de 2007, sob a direção do professor editor Joaquim Sucena Lannes (falecido em 2022), o OutrOlhar passou por importantes mudanças editoriais, como a vinculação do jornal-laboratório à disciplina de Jornalismo Impresso e a opção por definir os estudantes de Ensino Médio das escolas públicas e particulares de Viçosa como seu público de interlocução, o que também impactou na redefinição de seu perfil editorial.
Em sua trajetória, o OutrOlhar enfrentou desafios como restrições orçamentárias e mudanças na prática jornalística e nos hábitos de leitura e consumo de informação. Inclusive entre os jovens, seu público de interlocução prioritária. O avanço tecnológico torna os leitores e consumidores de notícias cada vez mais inseridos no mundo virtual e interessados no consumo de notícias com formato de fastnews. Isso tem tornado cada vez mais necessário reinventar o jornalismo para enfrentar as novas demandas desse mercado. Um dos maiores desafios dos jornais, incluindo os jornais-laboratório, é manter o leitor jovem interessado em suas narrativas, garantindo a qualidade do conteúdo.
Nessa direção, o jornal-laboratório busca se transformar ainda mais, tornando-se um produto de jornalismo convergente, inicialmente vinculado à nova disciplina do Curso de Jornalismo da UFV, de Jornalismo Convergente. A primeira turma da disciplina buscou estudar, compreender e produzir o jornalismo convergente, readequando o perfil editorial do OutrOlhar e ampliando sua abrangência para além de Viçosa, uma vez que estará disponível também em formato digital. Com isso, buscando manter laços com a proposta inicial do jornal-laboratório, buscou-se enfatizar o público jovem, considerado aquele que tem de 15 a 29 anos de idade, conforme o Estatuto da Juventude. Assim, o jornal está buscando se adaptar às transformações tecnológicas e se reinventando, mantendo sua relevância e resistência no contexto contemporâneo. A nova fase do OutrOlhar, inaugurada em 2023, está sob coordenação da professora Isaura Mourão Generoso. Seu objetivo é manter firme seu propósito de espaço de experimentação e de integração entre a Universidade e a sociedade, por meio de um jornalismo convergente, potencializando elementos de linguagem, repertório, conteúdo e referências que dialoguem com a juventude brasileira.